OS
DEPUTADOS DE SINTRA NO PERÍODO DA REGENERAÇÃO
por Fernando
Moreira
Parte da Comunicação
apresentada em 4 de Maio de 2007 no III Encontro de História de Sintra. promovido pela Alagamares
1.
Eleições e sistema eleitorais
As
eleições, tal como hoje as conhecemos, são o produto das revoluções liberais. A
transformação do súbdito em cidadão acarretou o reconhecimento do direito de
voto. O poder deixou de ser legitimado pelo direito divino e passou a sê-lo
pela vontade dos cidadãos. O sistema político deixou de centrar-se no rei que
acumulava todos os poderes, para passar a um modelo de repartição e delegação
de poderes, assente na soberania do povo expressa através de um sistema
representativo expresso através do voto. Desse modo, o sufrágio tornou-se o
fiel da balança de todos os sistemas políticos que se afirmam assentes na
vontade popular.
Todavia,
desde logo, a burguesia liberal dominante não aceitou um regime pleno
de sufrágio, impondo diversos limites ao exercício do direito de voto.
São
conhecidos esses limites – desde o voto censitário (reservado aos que dispunham
de determinado rendimento), até voto capacitário (privilegiando o nível de
instrução ou o desempenho de certas funções), passando pelo voto limitado (em
função do sexo, raça ou convicções político-religiosas).
A
essas limitações à constituição do corpo eleitoral, restringindo a expressão da
vontade geral, há que acrescentar as que decorriam do modo de escrutínio.
Com
efeito, diversos modelos foram sendo aplicados, quer na constituição dos
círculos eleitorais, quer na forma de apurar os resultados e transformá-los em
mandatos representativos, isto é, nos deputados que no Parlamento expressariam
a vontade da Nação.
Recorde-se
ainda que, numa perspectiva restritiva, os sistemas eleitorais, no seu início,
não concebiam sequer a eleição directa dos representantes, tendo instituído um
modelo em que o eleitor elegia um representante, o qual por sua vez escolheria
o deputado da Nação, sendo que nesta escala o funil censitário era
sucessivamente estreitado.
No
período a que esta comunicação diz respeito – 1852-1910 – tal situação tinha
sido já ultrapassada pelo Acto Adicional à Carta Constitucional e era já o
eleitor que escolhia directamente o deputado. Mas tal simplificação já não ocorreu
quanto à extensão do direito de voto, tendo vigorado três modelos, nem quando
ao modo de escrutínio, em que se adoptaram seis modelos.
Quanto
à extensão do sufrágio devem considerar-se as leis de 1852, 1878 e 1895.
A lei de 1852 tinha por base um sufrágio restrito de base
censitária, obrigando a que cada eleitor pagasse pelo menos 1000 réis de
imposto anual. Tal legislação vigorou 26 anos sendo substituída em 1878.
Nesse ano a nova lei eleitoral instituiu um sufrágio muito alargado,
conciliando os requisitos censitários com os capacitários (saber ler e
escrever) e sociais (chefes de família), quase estabelecendo o sufrágio
universal masculino. Todavia no final do século, a lei de 1895,
da autoria de João Franco, introduziu nova restrição no sufrágio,
excluindo os chefes de família que não soubessem ler e escrever ou não
pagassem pelo menos 500 réis de imposto. Quanto ao modo de escrutínio
devem considerar-se as leis de 1852, 1859, 1884, 1895, 1896 e 1901.
Através da sua breve análise observaremos como a adopção dos vários
modelos pôde condicionar de forma significativa a conversão do voto dos
eleitores em mandatos parlamentares.
A lei
de 1852 estabeleceu 37 círculos eleitorais no continente, todos eles com escrutínio
maioritário plurinominal a duas voltas, isto é, cada círculo elegia pelo menos
dois deputados e haveria uma segunda volta em caso de algum ou alguns dos
candidatos não obter pelo menos ¼ dos votos do «número total dos votantes». Na
segunda volta participavam os mais votados, em número igual ao tripo dos
lugares vagos, sendo então suficiente qualquer maioria. Estava-se no período de
estabelecimento das formações partidárias – Partido Regenerador e Partido
Histórico.
A lei
de 1859 instituiu os círculos uninominais com escrutínio maioritário a duas
voltas (caso não se registasse maioria absoluta à primeira volta).
A lei
de 1884 foi a mais inovadora, mas também a mais complexa. Manteve os
círculos uninominais com escrutínio maioritário a uma volta (maioria relativa),
mas estabeleceu círculos plurinominais com sede nas capitais de distrito num
sistema de escrutínio de voto limitado ou de lista incompleta (isto é, nos círculos
que elegessem 3 deputados a lista só poderia ter 2 nomes, os que elegessem 4
teriam até 3 nomes e os que elegessem 6 teriam até 4 nomes, assim se garantindo
a representação das minorias) e ainda um círculo nacional de acumulação de
votos, para eleger 6 deputados desde que tivessem mais de 5000 votos.
A lei
de 1895 reintroduziu os círculos plurinominais, totalmente coincidentes com
os distritos administrativos, elegendo no mínimo 3 deputados sendo o escrutínio
maioritário a uma volta.
Logo
no ano seguinte, o mesmo governo regenerador, através da lei de 1896, manteve
o escrutínio maioritário a uma volta e os círculos plurinominais, mas apenas em
Lisboa e Porto, sendo o restante território constituído por círculos uninominais.
Finalmente,
a lei de 1901 surgiu num contexto de total repartição de poder
entre
os partidos Regenerador e Progressista, e destinou-se a impedir que os republicanos,
e principalmente o novo Partido Regenerador-Liberal criado por João Franco,
pudessem conseguir representação parlamentar. Para evitar que o voto urbano em
Lisboa e Porto reflectisse os anseios republicanos, ambas as cidades foram
divididas em dois círculos – ocidental e oriental – por sua vez agregados aos
concelhos rurais limítrofes. No caso de Sintra, ficou integrada no círculo de
Lisboa ocidental. A lei – crismada por João Franco como «ignóbil porcaria» -
conseguiu amplamente os seus objectivos: nenhum republicano no Parlamento e
apenas um franquista (por concessão do Governo) para retirar argumentos a João
Franco. As oscilações que se observam na legislação eleitoral decorreram menos
de um debate ideológico e técnico e mais das conjunturas políticas que então se
viveram.
A
legislação de 1852 é, nalguma medida, fundadora do novo sistema
eleitoral que tinha por base a eleição directa.
Em 1859
o surgimento dos círculos uninominais ocorreu por iniciativa do Partido
Histórico, então no poder. Pretendeu-se uma representação parlamentar mais
próxima dos eleitores e a ela não será estranha a tese defendida por Alexandre
Herculano no ano anterior, em 1858, quando justamente resignara ao lugar de
deputado para que fora eleito no círculo de Sintra. Recorde-se que Herculano
era figura próxima e influente do rei D. Pedro V, um rei que procurou influenciar
o curso dos acontecimentos políticos. Em 1878 não se modificou o modo de
escrutínio, mas sim o direito de sufrágio. Recorde-se que nesse período as
lutas pelo sufrágio universal tinham conseguido elevado sucesso na Europa e que
em Portugal se tinham criado o Partido Socialista (1875) e o Partido
Republicano (1876). Convinha ao poder aumentar o enquadramento das massas e
retirar base de apoio aos partidos anti-monárquicos.
Em 1884
foi a vez de se modificar a constituição dos círculos eleitorais e o modo
de escrutínio. Esta lei eleitoral surgiu após uma certa guerra de extermínio movida
pelo Partido Regenerador ao Partido Progressista. O Partido Progressista
surgira em 1876 (resultante da fusão do Partido Histórico com o Partido
Reformista) e estivera no poder entre 1879 e 1881. As divisões entre ambos
atingiram tais proporções que quando os Regeneradores regressaram ao poder em
1881 quase expulsram os progressistas do Parlamento, onde apenas conseguiu 6
deputados, menos do que os 8 que Fontes Pereira de Melo concedeu ao residual
Partido Constituinte de José Dias Ferreira. Contudo, em 1883-1884 as relações
entre Regeneradores e Progressistas normalizaram- se e foi possível um
entendimento que esteve na origem de novo Acto Adicional à Carta Constitucional
e na aprovação de uma lei eleitoral que garantisse a representação das
minorias. Nesse ano os Progressistas (ainda na oposição) conseguiram passar de
6 para 28 deputados. Em 1895, num período em que faziam escola as teses
do engrandecimento do poder régio, em que o Partido Progressista estava
fragilizado ainda na sequência do Ultimato inglês e estabelecia contactos com
um Partido Republicano em crescendo, o Governo regenerador de Hintze Ribeiro,
que tinha João Franco como ministro do Reino, resolveu ter uma atitude refundadora,
mexendo simultaneamente na extensão do sufrágio e no modo de escrutínio, procurando
reduzir a base de apoio do republicanismo e centralizar definitivamente no
Governo a definição do resultado eleitoral. Por tal modo o fez que os partidos
da oposição recusaram candidatar-se e o Parlamento ficou apenas constituído por
regeneradores. Passou à História como o «Solar dos Barrigas». Para obviar a tal
«escândalo», no ano seguinte, em 1896, o mesmo governo e o mesmo
ministro foram forçados a inverter totalmente a situação, regressando aos
círculos uninominais, excepto em Lisboa e Porto. Por fim, o mesmo «ferro» com
que João Franco tentou «matar» os opositores, serviu para o «matar» a ele. De
facto, João Franco abandonou o Partido Regenerador e constituiu um novo
partido, o Partido Regenerador-Liberal. Em 1901 foi a vez de o dois
partidos do rotativismo se entenderem para criarem uma lei que, na prática,
excluía do Parlamento todos os que não fossem patrocinados por Regeneradores ou
por Progressistas. João Franco baptizou a lei e o conluio entre os partidos
dominantes de «ignóbil porcaria».
Por
esta breve resenha parece ficar claro que as modificações na legislação eleitoral
decorreram dos entendimentos e desentendimentos entre os partidos dominantes,
fosse para se anularem reciprocamente, fosse para anular partidos emergentes. O
debate político-ideológico sobre o melhor modo de representar a vontade dos
eleitores esteve quase sempre ausente.
2.
Os deputados de Sintra
É,
pois, neste quadro legislativo que se processa a representação de Sintra na Câmara
dos Deputados.
No
período que consideramos Sintra foi «cabeça de círculo» em 20 eleições (anexo
4.1). Nas três primeiras – 1852, 1856 e 1858 – foi círculo plurinominal elegendo
2 deputados, nas restantes 17 foi círculo uninominal, perfazendo no total a
eleição de 23 deputados. Considerar-se-ão, contudo, ainda mais dois, pois houve
lugar a duas eleições suplementares, uma para substituir um deputado chamado
para ministro da Justiça, outra para suprir a vacatura decorrente de uma
renúncia ao exercício do mandato parlamentar. Por outro lado, uma vez que se
registaram várias reeleições, o número de deputados diferentes que representaram
Sintra foi de 14.
Estes
números demonstram que Sintra foi um círculo eleitoral com uma elevada rotatividade
dos seus representantes, além de que a maioria não tinha raízes locais. Aliás,
a proximidade com Lisboa, centro do poder, tornava o círculo palco da colocação
de deputados por parte do Governo, assim contribuindo para a solidez da maioria
governamental. Embora quase sempre se registasse concorrência eleitoral, os
deputados eram eleitos por largas maiorias (Anexo 4.2). Tal demonstra que
Sintra era tida como «burgo podre», isto é, um círculo eleitoral manipulável
pelos chefes partidários que nele faziam eleger o candidato que lhes conviesse.
Quando
assim não sucedia, como foi o caso de 1868, o candidato governamental (presumível
vencedor), perante a força do candidato da oposição acabou por desistir e não
se apresentar às urnas. Ou seja, a disputa eleitoral fez-se sempre de forma
ordeira e o resultado eleitoral era sempre previsível, notando-se que em quase
todas as eleições o deputado eleito representava as cores governamentais, ou
então, quando o círculo elegia dois deputados poderia haver uma salomónica
distribuição dos eleitos: um a favor do Governo, outro a favor da Oposição
(Anexo 4.3). Enfim, Sintra, vila de Corte, não convinha que se tornasse terreno
de acesas querelas eleitorais. É sobre os catorze eleitos que representaram
Sintra na Câmara dos Deputados que incidem as páginas seguintes, registando o
seu trajecto pessoal e político e qual a relação que mantiveram com o círculo
que representavam.
1.
Frederico Guilherme da Silva Pereira (1806-1871).
Deputado
eleito por Sintra em 1852
Era
natural de Monção, onde nasceu a 28 de Abril de 1806, e morreu em Lisboa, a 18
de Fevereiro de 1871, filho de Francisco Xavier da Silva Pereira, coronel de
Infantaria e governador da praça de Campo Maior, e de Antónia Josefa de Abreu.
Casou com Ana Cândida dos Reis, filha de um capitão-mor de Sintra, Máximo José
dos Reis. Membro de uma numerosa prole, era irmão de Francisco Xavier da Silva
Pereira, 1.º conde das Antas, de José Joaquim da Silva Pereira, marechal de
campo, de António Júlio da Silva Pereira, de Joaquim Narciso da Silva Pereira,
general de brigada, todos parlamentares, e ainda de Adriano Augusto da Silva
Pereira, escrivão da Relação do Porto.
Aluno
das disciplinas de Retórica e Antiguidades no Colégio das Artes (Coimbra),
formou-se em Direito (1827) e fez carreira da magistratura, ascendendo a juiz
do Tribunal da Relação do Porto e depois a juiz-presidente do Tribunal da
Relação de Lisboa. Fez parte da Maçonaria onde chegou a grão-mestre do Círculo
Irlandês de Lisboa (1853 e 1871). Era fidalgo da Casa Real e comendador da
Ordem de Nossa Senhora de Vila Viçosa. Foi ministro da Justiça e dos Negócios
Eclesiásticos no governo regenerador do duque de Saldanha (1853-1856), gerindo
também interinamente a pasta da Fazenda (Novembro de 1855 a Janeiro de 1856),
quando o colega Fontes Pereira de Melo se ausentou em missão financeira ao
estrangeiro. Daí em diante, nunca mais regressou à política activa, embora o
seu nome tenha ainda figurado no elenco da Comissão Central Eleitoral do
Partido Regenerador, aquando das eleições de Maio de 1858.
Foi
eleito deputado em 1851, pelo círculo minhoto de Arcos de Valdevez, e reeleito
em 1852 pelo círculo de Sintra. Na primeira legislatura foi membro das
comissões de Verificação de Poderes e de Petições, esgotando a sua actividade e
as suas intervenções no despacho dos pareceres delas provenientes. Na
legislatura de 1853-1856, em que representou Sintra, prestou juramento a 31 de
Janeiro de 1853 e, de novo, a 24 de Dezembro desse ano, por ter saído «reeleito»
pelo círculo de Sintra, no escrutínio suplementar realizado após ter terminado
o mandato ministerial. Integrou, então, as comissões de Verificação de Poderes,
Justiça, Legislação e Infracções (sendo membro-vogal desta última), bem como,
em 1853, a importante Comissão Especial encarregada de dar parecer sobre o Bill
de Indemnidade às ditaduras saldanhistas de 1851 e 1852.
Silva
Pereira apresentou um projecto de lei abolindo os castigos corporais militares,
por serem «incompatíveis com a civilização e a humanidade» e defendeu
um reforço de verbas para as obras públicas na região do Porto, em especial
destinadas à reparação e conclusão da estrada Vila Nova de Gaia- Lourosa.
Foi
quando sobraçou a pasta da Justiça (a partir de Setembro de 1853) que Silva
Pereira passou a apresentar obra, não só na Câmara dos Deputados, mas também na
Câmara dos Pares, onde interveio em diversas ocasiões no âmbito da gerência da
sua pasta ministerial. Em nenhuma das suas iniciativas legislativas há qualquer
referência a Sintra e ao seu concelho.
2.
Torcato Máximo de Almeida (?-?).
Deputado
eleito por Sintra em 1852
No
plano biográfico apenas se sabe que a sua filha casou com um futuro deputado
pelo círculo, Francisco Joaquim da Costa e Silva, sendo por esse motivo
compadre de outro parlamentar, António da Costa e Silva, 1.º visconde de Ovar. Foi
eleito uma única vez, em 1852, e nunca interveio no hemiciclo. A sua única
participação na actividade parlamentar resumiu-se ao envio para a Mesa de uma
representação da Câmara Municipal de Sintra, para que o concelho fosse
dispensado de pagamento das terças, e a subscrever iniciativas de outros
deputados, entre eles a emenda a um artigo do orçamento do Ministério das Obras
Públicas (1855), sobre encargos com obras de melhoria da navegação no rio Douro
e continuação da estrada marginal. Rejeitou o projecto de lei apresentado pela
Comissão Eclesiástica para dispensar os párocos de pagarem às câmaras
municipais o imposto sobre as côngruas. Pertenceu à comissão de Agricultura nos
anos de 1853 a 1855. Foi nessa condição que, em Março de 1855, subscreveu um
parecer sobre as devastações causadas pelas inundações do rio Tejo, o qual
propunha um empréstimo «à classe dos lavradores» que em anos anteriores e em
situações análogas também fora concedido.
3.
Joaquim Narciso da Silva Pereira (1799-1873).
Deputado
eleito por Sintra em 1853, em eleição suplementar
Nasceu
em Valença em 22 de Outubro de 1799 e morreu em 5 de Dezembro de 1873. Filho de
Francisco Xavier da Silva Pereira, governador militar da praça de Campo Maior e
de sua mulher Antónia Josefa de Abreu, era pois irmão de Frederico Guilherme da
Silva Pereira, deputado e ministro da Justiça e também do 1.º Conde das Antas
de quem foi ajudante às ordens desde 1834 até 1851, de José Joaquim da Silva
Pereira, marechal de campo e deputado, de António Júlio da Silva Pereira,
deputado.
Joaquim
Narciso seguiu a carreira militar. Assentou praça em 1816, no Batalhão de
Caçadores n.º 7, foi cadete em 1817 e alferes em 1820, prosseguindo a carreira
até ao posto de brigadeiro. Tinha a Medalha de Fidelidade ao Rei e à Pátria, a
Medalha da Restauração, o grau de comendador da Ordem de Carlos III (Espanha),
o de cavaleiro da Ordem de S. Bento de Avis e de Isabel, a Católica (Espanha),
e a cruz de S. Fernando de 1.ª e 2.ª classe (Espanha). Foi eleito deputado pelo
círculo de Sintra, para a legislatura de 1853-1856, na eleição suplementar de
30 de Outubro (juramento a 23.12.1853). Tal eleição foi necessária para
preencher a vacatura criada com a nomeação do seu irmão para ministro da
Justiça. No hemiciclo subscreveu uma proposta para que os contínuos da Câmara
de Deputados fossem equiparados aos das secretarias de estado com o vencimento
de 300$000 réis.
4.
Lourenço Correia Manuel de Carvalho Aboim (1812-?).
Deputado
eleito por Sintra em 1856
Deste
deputado sabe-se que nasceu em Lisboa em 1812, filho de António Correia
Manuel Carvalho Aboim, que serviu num regimento de cavalaria da capital (no
seio do qual foi promovido a tenente em 25.12.1840), e que era um destacado
proprietário rural da Estremadura. Foi eleito para em 1856, por Sintra, e em
1860 por Mafra. Provavelmente devido à sua condição de agricultor, logo no
início da décima legislatura foi eleito membro da Comissão de Vinhos
(4.2.1857). Apesar de não se ter apresentado a muitas sessões entre Março a
Dezembro de 1857, por motivo de prolongada doença, nem por isso deixou de
promover iniciativas nas Cortes durante esse ano, embora nenhuma seja associada
ao círculo de Sintra, mas a interesses gerais da Estremadura. Na sessão de
18.2.1857, requereu ao Ministério das Obras Públicas que remetesse à Câmara
todas as informações
referentes às propostas de adjudicação da empreitada de construção da estrada
de Loures a Torres Vedras.
Manifestou-se
igualmente sobre assuntos de outras regiões do país ou grupos profissionais - a
reivindicação de Sousel voltar a ser concelho e a reforma dos oficiais do
exército julgados incapazes para o serviço activo pelas juntas militares – ou
sobre assuntos de índole social, nomeadamente sobre os expostos. Já como
representante de Mafra interveio fundamentalmente sobre questões relacionadas
com a agricultura: pediu informações sobre a produção de cereais de 1855 a
1859, o seu consumo anual, o valor das importações e exportações desde 1841, e
a média dos preços nos mercados de Lisboa, Porto, Londres, Odessa e portos da
América. Pretendia obter uma panorâmica da conjuntura económica relativa aos
cereais que o habilitasse a apresentar projectos de organização no âmbito da
produção agrícola. Noutra intervenção defendeu a necessidade de uma fácil
comunicação entre os caminhos de ferro do Norte e do Leste e Mafra, Ericeira e
Malveira, pois nestas vilas existiam importantes mercados de gado vindo do
Alentejo e das Beiras, para consumo na Estremadura e em Lisboa. Também para
facilitar o escoamento, propôs ao Ministério das Obras Públicas que
orçamentasse a despesa necessária para construir a estrada de Mafra ao Sobral
de Monte Agraço, passando pela Malveira. Em 19.3.1860 fez o mesmo pedido
relativamente à estrada da Ericeira a Sintra e de Sintra a Cascais. A culminar
a sua acção neste campo propôs alterações a um projecto sobre a contribuição
industrial, no que respeitava à vertente agrícola, nomeadamente para desagravar
os encargos dos comerciantes de gado.
Foi,
portanto, como deputado por Mafra que veio a produzir uma intervenção no âmbito
da política de obras públicas relacionada com Sintra.
5.
Francisco de Sena Fernandes (1802-1877?).
Deputado
eleito por Sintra em 1856 e 1858
Nasceu
a 1 de Abril de 1802, em Lisboa (Belém), e morreu depois de 1876.
Filho
de José Pedro Fernandes, matriculou-se na Universidade de Coimbra, em
1817, primeiro em Matemática e Filosofia e depois no Curso Jurídico, terminando
Cânones em 1823. As suas ideias liberais obrigaram-no a emigrar em 1828, só
tendo regressado a Lisboa em 1833. Foi juiz de Direito em várias comarcas,
entre as quais Almada e ascendeu a juiz da Relação de Lisboa. Foi também
proprietário.
Poeta,
contemporâneo de Castilho que o elogiou no prefácio da sua obra Primavera, foi
um participante activo dos celebrados «outeiros» coimbrões. Colaborou,
anonimamente, no Arquivo Popular e na Revista Universal Lisbonense e
foi autor de Os direitos individuais. Himno (Lisboa, 1826). Era cavaleiro
da Ordem de Cristo. Foi eleito duas vezes deputado por Sintra, em 1856 e
1858. Pertenceu às comissões de Estatística (1857) e Eclesiástica,
(1857, 1858 e 1861), tendo assinado alguns pareceres. No
hemiciclo começou por se referir ao pagamento das terças que um grande número
de municípios do Reino não podiam pagar, reclamando uma nova regulamentação
para esse imposto «anacrónico e vexatório» enviando, logo a seguir, a
representação da Câmara Municipal de Sintra sobre as terças em dívida
para o qual pediu um parecer urgente, pedido em que viria insistir. Depois
enviou para a mesa uma representação dos habitantes de Belas para que
lhes fosse restituído o concelho, e aproveitou para estigmatizar a «abstrusa
» divisão territorial, lembrando que dela dependia a organização da
instrução, das finanças ou da economia.
Pronunciou-se
igualmente sobre a situação de alguns oficiais reformados que, por serem da
Armada ou do extinto Batalhão Naval, ainda não haviam sido beneficiados com
aumentos, exigindo que o projecto de Sá da Bandeira sobre o assunto, que se encontrava
na comissão parlamentar, fosse rapidamente apreciado e votado. Subscreveu ainda
vários requerimentos: um para se proceder a melhoramentos e reparações na
estrada de Coimbra ao Porto que se encontrava intransitável; outro ao ministro
das Obras Públicas, acerca do andamento da construção das estradas da zona de
Sintra; outro para que fossem dadas pensões às famílias dos médicos falecidos
«no exercício da sua profissão» aquando das epidemias de febre amarela e
cólera. No Parlamento, como o próprio confessou, era conhecido como «o
apagador», pois frequentemente interrompia discursos de outros deputados para perguntar
ao presidente da Mesa se a matéria já tinha sido suficientemente discutida,
interpretando o sentir da maioria e «fechando» as discussões, assim «apagando»
as polémicas estéreis tantas vezes levantadas pela oposição.
Alexandre
Herculano de Carvalho e Araújo (1810-1877)
Deputado
eleito por Sintra em 1858 (resignou)
Foi
uma das maiores figuras do seu tempo, quer como intelectual, quer como cidadão
interveniente na vida social, cultural e política do seu País. Apenas será
considerado um brevíssimo apontamento biográfico, pois uma incursão pela sua
obra e acção política não seria compatível com o modelo adoptado para a
apresentação dos deputados sintrenses. Herculano nasceu a 28 de Março de 1810,
no Pátio do Gil, em Lisboa, e faleceu na sua Quinta de Vale de Lobos, no
Ribatejo, em 13 de Setembro de 1877. Era filho de Maria do Carmo de São
Boaventura e de Teodoro Cândido de Araújo, recebedor da Junta dos Juros.
Liberal convicto, sofreu as agruras do exílio e no regresso tornou-se uma
figura incontornável das Letras e um incansável do património
histórico-cultural nacional. Nunca se afastou do debate político e a sua
palavra era frequente escutada na Corte. Quando foi eleito deputado por Sintra,
em 1858, vivia já um tempo com o movimento político de que fora mentor, A
Regeneração. Herculano entrincheirava-se na defesa das formas «puras» do
Liberalismo, sendo uma das mais conhecidas a sua defesa do Municipalismo.
Tal
posição, no plano da representação política nacional, correspondia à
defesa da «eleição de campanário», isto é, a que o deputado deveria ser eleito em
função do estrito interesse local. Foi, pois, sem surpresa, que resignouao
cargo de deputado para que fora eleito.
As
razões da recusa deram origem a um interessante opúsculo, Carta aos Eleitores
do Circulo de Cintra por Alexandre Herculano (Lisboa, 1858).Tendo
percorrido o País de lés-a-lés e conhecido as «misérias» e «abandono» em que
este se encontrava, considerava «como instrumentos de uma reforma futura, a
eleição exclusivamente local e os esforços constantes para obter, contra o
interesse das facções, dos partidos e dos governos, a redução dos grandes
círculos a círculos de eleição singular, que um dia possam servir à restauração
da vida municipal, a expressão verdadeira da vida pública do país, da garantia
da descentralização administrativa, como a descentralização administrativa é a
garantia da liberdade real […] Aconselho-vos, como acabais de ver, uma coisa
para a qual os estadistas de profissão olham com supremo desprezo, a eleição de
campanário, só a eleição de campanário, a eleição de campanário, permiti-me a
expressão, até à ferocidade». No ano seguinte fizeram-lhe a vontade e criaram-se
165 círculos uninominais. As eleições continuaram a ser objecto das maiores
atropelos e falsidades. Herculano não voltou ao Parlamento e foi fazer azeite
para o Vale de Santarém.
6.
António José Luís de Saldanha de Oliveira Juzarte Figueira e Sousa
(1836-1891),
4.º conde e 1.º marquês de Rio Maior
Deputado
eleito por Sintra em 1858, em eleição suplementar
Nasceu
a 8 de Julho de 1836 em Lisboa e morreu a 4 de Fevereiro de 1891 na mesma
cidade. Era filho do 3.º conde de Rio Maior, João de Saldanha de Oliveira Juzarte
Figueira e Sousa, e de sua mulher, Isabel de Sousa Botelho Mourão
e Vasconcelos. Foi irmão do deputado e director da Casa da Moeda, José Luís de
Saldanha Oliveira e Sousa. Era senhor dos morgados de Oliveira, Vale de
Sobrado, Azinhaga e Barcarena, entre outros, e oficial-mor da Casa Real com o
cargo de mestre-sala, último administrador e usufrutuário dos bens da comenda
de Santa Maria de África da Ordem de Cristo, grã-cruz das ordens da Rosa
(Brasil), de Leopoldo (Bélgica), da Coroa (Itália), de S. Gregório Magno (Santa
Sé) e comendador da Ordem de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa. O
título de conde foi-lhe renovado por decreto de 13 de Abril de 1853, sendo
elevado a marquês por decreto de 19 de Maio de 1886. Casou em Alhandra, em 1861,
com Maria Isabel de Lemos Roxas Carvalho e Meneses de La Rue Saint-Léger, filha
herdeira dos 2.ºs marqueses da Bemposta-Subserra.
Frequentou
a Universidade de Coimbra, concluindo o curso de Direito em 1858.
Continuou as tradições de caridade e filantropia da família, vindo a exercer
os cargos de provedor da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa e de vogal do
Conselho Superior de Beneficência, sendo também sócio da Sociedade das Casas de
Asilo de Infância Desvalida de Lisboa. Na Misericórdia de Lisboa, começou por
exercer o cargo de adjunto do provedor e ascendeu a provedor (6.8.1870), com 33
anos, cargo em que se manteve cerca de 18 anos. Além da profunda reforma a que
procedeu instituição, doou à Santa Casa 7.500$000 réis da sua fortuna, para a
criação de um fundo destinado a socorrer nas suas residências as raparigas e
mulheres expostas impossibilitadas de trabalhar. Dele partiu a proposta de
extinção da roda dos expostos, a criação de medidas de incentivo à maternidade
e de medidas inserção dos expostos na sociedade e a melhoria das condições dos
vários estabelecimentos dependentes da Misericórdia. Combateu o comércio das
lotarias estrangeiras, por prejudicarem os rendimentos da Santa Casa, de que
resultou uma greve dos cambistas que vendiam os bilhetes e cautelas e uma
campanha de descrédito na imprensa, que levou o marquês de Rio Maior a pedir a
exoneração do cargo, em Setembro de 1888. Tal como seu pai, desempenhou também funções
de presidente da Câmara Municipal de Lisboa, por duas vezes (1870 e 1871). Foi
adido honorário da Legação de Portugal em Paris e sócio efectivo do Instituto
de Coimbra. Em 1881 foi convidado para a pasta dos Negócios Estrangeiros
no ministério organizado por Rodrigues de Sampaio, cargo que
não aceitou. Morreu em Lisboa, no seu Palácio da Anunciada, e legou os bens ao
sobrinho mais velho, deixando o usufruto à mulher.
Era
ainda muito jovem – contava 22 anos – quando foi eleito deputado pelo círculo
de Sintra em 1858. Apesar de não ter feito intervenções, integrou as comissões
de Administração Pública e Diplomática, em 1859. Em 17 de Janeiro de 1873 tomou
posse do lugar de par do Reino, como sucessor de seu pai. Fez parte das
comissões do Regimento (1873);Negócios Externos (1874, 1880-1884, 1886-1887);
Fazenda (1873-1874); Eclesiástica (1875-1877); Agricultura (1879-1880, 1885,
1890); Verificação de Poderes (1880, 1890); Administração Pública (1880-1881,
1886-1887, 1890); Resposta ao
Discurso da Coroa (1887-1890).
Na
câmara alta, o marquês de Rio Maior discursou várias vezes sobre assuntos concernentes
à Misericórdia de Lisboa e beneficência pública e fez também diversas
intervenções acerca de necessidades do município de Lisboa. Politicamente, o
marquês de Rio Maior começou por apoiar o Partido Regenerador, mas
progressivamente entrou em rota de colisão com Fontes Pereira de Melo. As
críticas que lhe dirigiu abrangeram um vasto leque de matérias, desde a
concessão do caminho-de-ferro de Cacilhas até importantes temas da agenda
política: reforma eleitoral, resposta ao discurso da Coroa, Código Administrativo,
as concessões de terrenos nas províncias ultramarinas, registo civil,
administração dos caminhos de ferro, situação agrícola, abusos eleitorais, gestão
financeira do Estado e reorganização do ensino da instrução primária e normal. A
propósito deste último assunto, mostrou-se contra o estabelecimento do ensino
obrigatório, considerando que este infringia os direitos dos pais de família e
que constituía um ataque à liberdade de consciência.
Não
surpreende, pois, que tenha saudado a queda dos Regeneradores e apoiado a
subida ao poder dos progressistas de Anselmo Braamcamp (1879).Todavia, menos de
um ano passado já enveredava por críticas várias ao Governo,
em especial por não adoptar as medidas necessárias a vencer a questão
financeira. Quando os Regeneradores voltaram ao poder, poupou o ministério
dirigido por Rodrigues Sampaio, mas não hesitou em criticar o governo
de Fontes Pereira de Melo, quer durante o debate sobre a resposta ao discurso
da Coroa, quer a propósito do orçamento de Estado, do projecto relativo ao
porto de Leixões e das reformas políticas (novo Acto Adicional à Carta Constitucional
e nova lei eleitoral).
Em
1886, voltou a apoiar o governo progressista, desta vez presidido por Luciano
de Castro, ao mesmo tempo que se envolveu com Casal Ribeiro na formação
de um partido político conservador que não se chegou a constituir.
Preferindo
a administração progressista à regeneradora, foi o marquês de Rio Maior quem
presidiu à reunião das maiorias parlamentares no Centro Progressista na noite
de 13 de Janeiro de 1890, na qual Luciano de Castro historiou as negociações
com o governo inglês a propósito dos conflitos em África que conduziram ao
Ultimato. Em 16 de Janeiro de 1890, declarava aos ministros do novo ministério
regenerador de Serpa Pimentel que se abstinha de discutir o programa
governativo apresentado. Num discurso anti-britânico, considerou que o gabinete
progressista agira de forma correcta na sua política colonial e diplomática e
defendeu uma aproximação à Espanha para formação de uma aliança.
7.
Carlos Ramiro Coutinho (1828-1897), 3.º barão de Barcelinhos e 1.º
visconde
de Ouguela
Deputado
eleito por Sintra em 1860
Nasceu
em Lisboa a 30 de Julho de 1828, cidade onde faleceu a 5 de Janeiro de 1897.
Era filho do negociante da praça de Lisboa, Ricardo Sylles Coutinho, falecido
em 23 de Junho de 1871, e de Rosa Máxima da Silva Coutinho. O pai era grande
amigo de José Estevão e foi um resistente liberal do tempo de D. Miguel, tendo
estado preso no Limoeiro, e também mais tarde, em 1844, por apoio às
actividades jornalísticas de António Rodrigues Sampaio contra o governo
cabralista. Casou a 26 de Novembro de 1860 com Rita Soares de Oliveira, filha
de Francisco José de Oliveira, negociante de grosso trato portuense.
Era
senhor de uma avultada fortuna, em parte por herança paterna, em parte como
resultado do matrimónio. Em 1863, era o contribuinte mais colectado no
bairro do Rossio em Lisboa, para além de possuir vastas propriedades no concelho
de Campo Maior. No todo, os seus bens de raiz estavam avaliados, em 1870, em
342 contos de réis. Possuía também um lote substancial de acções e inscrições,
entre as quais as do Banco de Portugal, de cujo Conselho Fiscal foi membro em
1863. Em 1872, fez parte de um grupo de capitalistas nacionais e estrangeiros,
em que se incluíam o barão de Lagos, o conde de Magalhães e o marquês de
Angeja, que planeava instituir um novo banco, o Banco Real e Nacional,
iniciativa que contudo se gorou. O título de 3.º barão foi confirmado em Carlos
Ramiro Coutinho a 8 de Fevereiro de 1864, sendo-lhe concedido o de visconde de
Ouguela em 31 de Maio de 1868.
No
plano académico formou-se em Direito (1854) e a sua vida pública teve início
com a nomeação para delegado do procurador régio, em Mafra (12.12.1855), lugar
que abandonou pouco depois para se dedicar à advocacia em Lisboa, em especial
no foro criminal. Entre 1860 e 1864 foi ajudante do procurador geral da Fazenda
Nacional. Tornou-se conhecido por ter defendido alguns criminosos célebres,
entre os quais André de Turnes, o criado que assassinara o conselheiro
Ildefonso Leopoldo Bayard, e pela sua disponibilidade para assistir réus
pobres. Bulhão Pato, um velho amigo, recordou mais tarde: “Transbordavam as
salas de audiência quando, em causas célebres, era patrono o moço advogado.
Pálido, a formosa cabeça povoada de cabelos loiros, olhos límpidos, voz velada
e insinuante”.
As
suas ideias, para a época, eram bastante avançadas. Ainda estudante, ligou-se,
em 1851, ao Centro Promotor dos Melhoramentos das Classes Laboriosas
e escreveu, pouco depois (1852) um texto que Camilo Castelo Branco
considerou mais tarde «socialista», embora não de um socialismo utópico.
Dava uma grande importância à educação dos pobres e considerava que a religião,
a ciência e a indústria eram as condições essenciais para o estabelecimento de
uma verdadeira democracia. Foi um acérrimo defensor da abolição da pena de
morte.
Alinhado
com o Partido Regenerador, foi eleito deputado pelo círculo de Sintra em 1860.
Participou nas comissões de Verificação de Poderes (1860) e de Forais (1861),
pugnou pela aprovação do novo Código Civil do visconde de Seabra e defendeu que
os bens das ordens monásticas femininas fossem consideradas pertença do Estado.
Durante a passagem pelo Parlamento insurgiu- se contra um projecto de lei que
permitia o julgamento sumaríssimo, sem direito a recurso, dos crimes cometidos
por escravos e libertos, contra a escravidão em Angola (1861).
Em
1872, esteve preso por alguns meses, acusado de ter participado numa conspiração,
em Julho daquele ano, com o general Cruz Sobral, o marquês de Angeja e outros,
para derrubar as instituições e levar a cabo a união de Portugal com a Espanha.
Este movimento, de contornos pouco claros e conhecido pela «Pavorosa»,
inseria-se na atmosfera politicamente agitada que se viveu naquele ano, em que
eclodiram algumas greves inusitadas em Portugal, se extremaram os sentimentos
em torno da questão religiosa e, no plano internacional, surgia de novo a
questão ibérica. Em 1873, Ouguela foi absolvido por falta de provas, mas,
amargurado, abandonou a vida pública e dedicou-se à literatura.
Desde
muito jovem dedicou-se à colaboração numa grande variedade de periódicos
tanto políticos como literários, entre os quais o Patriota, o Eco dos
Operários, a Revolução de Setembro, o Século e a Ilustração.
A sua vasta obra inclui: Defesa do Réu André de Turnes perante o
Juizo do Primeiro Distrito Criminal (1856), Os Salões (6 volumes,
1874-1886), Gil Vicente (1890), O Proletariado Europeu (1896), A
Luta Social (1893; 2ª edição, 1894); O Carrasco (1897). Fez parte da
Maçonaria e ocupou o lugar de Grão Mestre em 1892-1894. Era fidalgo da
Casa Real e possuía a grã-cruz da Ordem de Nichan Iflikar (Tunis), a
comenda da Ordem de Carlos III (Espanha), e o grau de cavaleiro da Ordem
de Isabel, a Católica (Espanha).
8.
António Mazziotti Júnior (1810-1874).
Deputado
eleito por Sintra em 1861
Nasceu
a 12 de Novembro de 1810 em Lisboa, na freguesia da Encarnação, e faleceu a 17
de Abril de 1874 em Colares, concelho de Sintra. Era filho de Francisca
Adelaide Metzener e de António Mazziotti, que foi vice-secretário da Sociedade
Promotora da Indústria Nacional. Teve como padrinho de baptismo e futuro tutor
o conselheiro Inácio António Ribeiro, tesoureiro-mor do Real Erário. Tinha
ascendência napolitana e germânica, pois o seu avô paterno, Vicente Mazziotti,
foi encarregado de negócios e cônsul de Nápoles em Lisboa, enquanto o avô
materno, Arnaldo Henrique Metzener, era um comerciante da cidade de Hamburgo
radicado em Portugal. Reuniu apreciável fortuna e tornou-se um abastado
lavrador e proprietário da região de Colares ligado à produção vinícola graças
ao seu casamento com Maria do Carmo Zeferino d'Azambuja Dias Pereira Chaves,
única filha e herdeira do morgadio de Sebastião Dias Pereira Chaves, afilhado
do marquês de Pombal. António Mazziotti Júnior obteve o título de comendador e
era o maior contribuinte do concelho de Sintra depois do conde de Redondo. A
sua instrução, porém, limitava-se a saber ler, escrever e contar e aos
rudimentos de gramática e de língua francesa e inglesa. Foi sócio da Real
Associação Central da Agricultura Portuguesa e «sócio correspondente
estrangeiro» da Real Associação dos Arquitectos Civis e Arqueólogos
Portugueses. Na política alinhou com o Partido Histórico e foi presidente da
Câmara Municipal de Colares (1853).
Foi
deputado uma única vez, eleito em 1861 pelo círculo uninominal de Sintra (juramento
a 10.6.1861), derrotando Francisco Joaquim da Costa e Silva. Em 1864 voltou a
candidatar-se no mesmo círculo, mas o seu anterior opositor obteve então a
vitória, apesar de as eleições terem decorrido na vigência de um governo de que
era apoiante.
Quase
todas intervenções que proferiu em S. Bento disseram respeito ao círculo que
representava. De entre todas destacam-se as seguintes: contrato para a
construção do caminho-de-ferro para Sintra; excessiva percentagem da
contribuição pessoal e predial que afectava os munícipes do concelho; estradas de
Sintra a Cascais e de Colares a Almoçageme; violências dos arrematantes do real
de água, sugerindo que a cobrança passasse a ser feita pelo Estado; actuação
prepotente dos agentes da Companhia das Águas e aos abusivos aboletamentos de
tropas em Belas, no trânsito entre Mafra e a capital. De igual modo apresentou
alguns projectos de lei, sendo os mais importantes os que propunham a
restauração dos concelhos de Colares e de Belas, integrados em 1855 no concelho
de Sintra (8.1.1862 e 16.5.1863); a construção de um caminho de ferro de Lisboa
a Mafra por Sintra (ou até Sintra), atendendo tratar-se de uma vila de Corte e
aos interesses económicos dos dois concelhos e da própria capital que assim
poderiam usufruir em melhores condições da riqueza agrícola e da indústria de
mármores dos dois concelhos (30.5.1864); a autorização para a Câmara Municipal
de Lisboa contrair um avultado empréstimo para construir «casas pequenas e
singelas às classes laboriosas» (17.3.1863), tema a que voltaria num
requerimento ao Ministro das Obras Públicas para indagar do paradeiro da
proposta de vários capitalistas que se propunham reedificar vários bairros de
Lisboa (21.3.1863) António Mazziotti nunca efectuou um discurso de fundo,
passou ao lado das grandes polémicas e na ordem do dia as suas intervenções
foram recorrentemente reduzidas à simples expressão «requeiro que a matéria se
julgue discutida», um chavão habitual em deputados menos notáveis das maiorias
parlamentares. No seu último ano parlamentar vários dos projectos de lei que
apresentou contaram apenas com a sua assinatura, evidenciando algum isolamento face
aos seus colegas e anunciando o fim da curta carreira de deputado.
9.
Francisco Joaquim da Costa e Silva (1826-1899).
Deputado
eleito por Sintra em 1864, 1865 e 1878
Nasceu
em 31 de Agosto de 1826 e morreu em Lisboa a 1 de Março de 1899. Filho de
António da Costa e Silva, 1.º barão e 1.º visconde de Ovar, par do reino e
ministro da Guerra interino, e de Teresa da Conceição Oliveira. Casou com
Margarida Helena de Almeida e Costa, filha de Torcato Máximo de Almeida,
deputado por Sintra, e de Helena Joaquina de Almeida e Costa. Fez carreira na
Administração Pública, sendo tenente do Batalhão dos Empregados Públicos quando
foi nomeado secretário-geral de Angola (23.4.1847). Foi oficial e secretário
graduado do Conselho Ultramarino e em 20 de Julho de 1876 ascendeu a
director-geral do Ultramar, tendo sido grande colaborador de Rebelo da Silva
quando este foi ministro da Marinha e Ultramar.
Pertenceu
à Maçonaria e foi figura importante do Partido Regenerador. Foi eleito
deputado para várias legislaturas: Angola (1851), Ovar (1860), Sintra
(1864
e 1865), Mafra (1869, Março e Setembro de 1870, 1871 e 1875) e novamente
por Sintra (1878). Foi eleito vice-secretário, vice-presidente e presidente da
Mesa da Câmara dos Deputados. Pela forma como exerceu a presidência, especialmente,
pela delicadeza, dignidade e imparcialidade, mereceu um voto de louvor da
Câmara tanto em 1878, como em 1879. Integrou várias comissões, entre elas, as
do Ultramar (1854, 1865 a 1867, 1870), Diplomática (1860, 1861, 1870), da
Marinha (1865 a 1867, 1871, 1877) e de Verificação de Poderes (1870, 1875).
O
primeiro projecto de lei que apresentou, em 1852, destinava-se a manter o livre
comércio da urzela em Angola. Subscreveu também, entre outros, o projecto de
lei que determinava que os bacharéis em Matemática pela Universidade de Coimbra
seriam, em determinadas condições, equiparados aos que tivessem concluído na
Escola Politécnica o curso de Estado Maior de Engenharia, podendo também ser
admitidos na Escola do Exército; Destaque também para o que extinguia no Estado
da Índia vários impostos, substituindo-os pela contribuição industrial (1866) e
o que determinava o número de deputados que deviam representar em Cortes os
círculos de Macau e de Timor (1870). As sublevações em Angola, em 1860, também
motivaram a sua intervenção porque, conforme declarou, tendo exercido um cargo
importante na administração daquela província, não podia ficar silencioso.
Aquando da discussão do projecto de lei que alterava a pauta geral dos direitos
de importação para géneros e mercadorias, incluindo os produzidos nas
províncias ultramarinas, usou da palavra para se manifestar contra a ideia da
sobrecarga dos géneros produzidos no Ultramar, e apresentou uma proposta para
se considerarem os direitos de exportação do café que fossem pagos nos portos
de procedência. Posteriormente apoiou também o projecto de lei autorizando o empréstimo
de 800 contos destinado a obras públicas nas províncias ultramarinas. Além das
questões ultramarinas sobre as quais interveio amiúde, a mais importante
intervenção relacionada com interesses do seu círculo eleitoral, reportou-se à
situação das arribas da Ericeira que ameaçavam desabar sobre o oceano.
Por
carta régia de 29.12.1881, foi nomeado par do Reino Também nesta Câmara
fez parte de numerosas comissões, nomeadamente as da Fazenda (1883
a 1886, 1890), Marinha (1884 a 1886, 1893, 2896), Ultramar (1886, 1887,
1896) e Especial para a Reforma Eleitoral (1884). A sua actividade foi exercida
sobretudo nas comissões. Usou da palavra para responder às observações de
António Augusto de Aguiar sobre o tratado com a Grã-Bretanha, de 26.1.1878,
relativo à Índia portuguesa, esclarecendo, entre outros factos, que o governo
português não tinha descurado o assunto e que estava a par de tudo o que se tinha
feito. Quando se discutiu o parecer sobre o projecto de lei que autorizava a
abertura de um crédito de 481.370$000 réis a favor do Ministério da Marinha e
Ultramar, para saldar as despesas das províncias ultramarinas no ano económico
de 1882-1883, interveio respondendo às afirmações de Pereira Dias sobre os
gastos improdutivos das colónias. Fez um discurso em que lembrou que aquelas
províncias faziam parte da Monarquia e por isso havia obrigação de atender às
suas necessidades como se fazia na metrópole. «Quem tem colónias tem de prover
às suas necessidades», além de que «a conservação das nossas províncias de
além-mar é a conservação da nossa autonomia [...]. Pouco valeríamos sem elas,
nenhuma consideração merecíamos se as não possuíssemos».
Nos
últimos anos da sua vida abandonou a política, dedicando-se apenas ao desempenho
das funções de director-geral do Ultramar. Tinha o grau de cavaleiro da Ordem
de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa e o de comendadorda Ordem de
Carlos III (Espanha).
10.
José Carlos Mardel Ferreira (?-?).
Deputado
eleito por Sintra em 1868
Presumivelmente
filho do conselheiro José Carlos Mardel Ferreira e irmão de Henrique Carlos
Mardel Ferreira e de Luís Carlos Mardel Ferreira, oficiais da Marinha. Era
casado com Amélia Couceiro, filha do proprietário José Maria de Sousa Couceiro.
Residiu na Rua da Bela Vista da Lapa, em Lisboa, e era accionista de diversas
empresas, arrendatário de foros de vários titulares e proprietário de uma
quinta no Dafundo, de diversos terrenos na Serra de Sintra e em Cascais e
também da Quinta do Anjinho, situada em Sintra, perto da Quinta do Ramalhão. No
entanto, a vida empresarial decorreu com algumas dificuldades, como a atestam
sucessivas hipotecas, até que nos anos de 1870 sofreu diversas execuções
fiscais por sentença judicial, num momento em que o seu paradeiro era já
desconhecido.
Terão
sido os problemas financeiros que o levaram a deslocar-se a Inglaterra em
finais de 1867 e ali se encontrava quando em Portugal se deram os
acontecimentos da Janeirinha. Se bem que a ordem pública não tivesse sido
profundamente afectada, a verdade é que as figuras comprometidas com o governo da
«Fusão» e as suas medidas administrativas e financeiras, não eram bem acolhidas
pelos novos ventos reformistas. Tal era o caso do anterior deputado pelo
círculo de Sintra e indigitado candidato às eleições de Março de 1868, Francisco
Joaquim da Costa e Silva. Por esse motivo o nome de Mardel Ferreira, mesmo fora
do país, começou a receber apoios para ser o candidato «popular» e
«progressista». Formaram-se comissões eleitorais (a de Belas foi presidida pelo
médico municipal Elisiário José Malheiros) e fizeram-se meetings em
Sintra, Belas, Colares e Cascais. Quando regressou a Portugal, Mardel Ferreira
«foi esperado em Carenque pelos seus amigos e influentes de Belas», em Belas
teve recepção com foguetes e a música a cargo da Filarmónica Belense e «no
Cacém achavam-se os amigos do mesmo sr. E influentes eleitorais, perto de 60
pessoas em trens e a cavalo que vieram ao seu
encontro festejando a sua chegada. No Anjinho esperava-o a Filarmónica de
Sintra e mais pessoas influentes no círculo». Perante tais manifestações de apoio,
o chefe do Governo, «o sr. Ávila [que] antes quer ver o diabo à cabeceira do
que o sr. Mardel no Parlamento» (Jornal do Comércio, 11.3.1868) acabou
por não apresentar um candidato governamental e Mardel foi tranquilamente eleito,
tendo obtido 1819 dos 1848 votos depositados na urna. Aliás, Costa e Silva
havia já retirado a sua candidatura, invocando «calúnias» e «intrigas» e o
receio de «sérias turbulências» se disputasse a eleição. Assim, Mardel foi
eleito deputado por Sintra para a legislatura de 1868-1869, além de também ter
sido votado no círculo eleitoral de Mafra. De acordo com as intervenções
proferidas na Câmara dos Deputados, afirmou-se sempre como deputado
«independente», mas o facto de ter subscrito um requerimento (26.5.1868) sobre
um assunto tão importante como a situação financeira do país, com Joaquim Tomás
Lobo de Ávila, deixa supor que estivesse alinhado com a facção «unha preta» do
Partido Histórico, hipóteses reforçada pelo apoio que lhe foi prestado pelo Jornal
do Comércio, pela oposição que lhe moveu o jornal regenerador A
Revolução de Setembro e pela neutralidade do jornal O Diário Popular.
Ligado ao Partido Reformista. Pertenceu às comissões parlamentares de
Recrutamento (1868) e de Verificação de Poderes (1868 e 1869). O primeiro
discurso substantivo ocorreu justamente a pretexto da discussão do parecer
sobre a polémica eleição no círculo de Cabeceiras de Basto. Nele traçou o seu
retrato como parlamentar - «não tenho dotes oratórios que entretenham
agradavelmente, mas hei-de fazer sempre diligência de expor a verdade como eu a
entender, sem pretensões, nem rebuço» - e expôs também as fragilidades da sua
formação jurídico-política ao
pretender desvalorizar uma determinação da lei por se encontrar inserta num
parágrafo e não na parte inicial de um artigo. Ferreira de Melo, futuro
visconde de Moreira de Rei, logo denunciou a «subtileza» da argumentação e
por tal modo correu a discussão que tudo terminou em tumulto e encerramento da
sessão (22.5.1868).Seguiram-se requerimentos vários de natureza
económico-financeira e a crítica à actuação de Governo nessa matéria, que
considerou avulsa e limitada por não se inscrever num plano financeiro definido
e coerente. Estavam nesse caso a abolição de terças e a modificação da lei de
jubilações e reformas, que na sua opinião criavam novas formas de tributação,
provocavam desigualdades e nada contribuíam para resolver os grandes problemas
do país: «Há quantos anos não estão os parlamentos portugueses a proclamar
economia, a votar sacrifícios, e esses sacrifícios ou se limitam a recair sobre
os menos protegidos, ou ficam letra morta nos arquivos das secretarias?»
(9.6.1868). Dias mais tarde (22 e 23.6.1868) apresentou um projecto de lei para
alterar a regulamentação da desamortização de bens municipais, fazendo com a
que a sua venda passasse do Tesouro Público para as câmaras municipais, pois havia
terrenos com valores tão diminutos (cerca de 30 réis) que os interessados não
se deslocariam às sedes do distrito; a terra continuaria fora do circuito comercial
e impedia-se até a mobilização de capitais em favor do Estado, uma
vez que o produto das transacções deveria ser aplicado em inscrições da Junta
do Crédito Público. Não só a questão das economias preocupava Mardel Ferreira.
Também a «moralidade» - uma palavra chave no jargão político da
época - surgiu no seu discurso durante o debate sobre a realização de sessões nocturnas:
«mas que motivo há para que venhamos trabalhar de noite e descansar
de dia? Só por que faz calor? Mas então todos os empregados do Estado
podem invocar o nosso exemplo e dizerem que não podem trabalhar de
dia porque faz calor»! (26.6.1868). Com
intervenções deste teor, os interesses dos eleitores de Sintra e Cascais raramente
foram invocados. Limitou-se a requerimentos acerca do inquérito em curso à
Quinta Regional da Granja (16.6.1868), da destruição da pesca em Cascais
provocada pelas apertadas redes de arrasto (5.8.1868) e do estado das obras da
linha de caminho-de-ferro (17.8.1868). Dera-se, entretanto, a posse do governo
do Partido Reformista sobre o qual disse manter uma «posição puramente
expectante», mas não isenta de crítica, face a um «governo que foi organizado
em presença de circunstâncias inteiramente alheias a todos os preceitos e
formas constitucionais», feita pelos «grupos políticos a que eu chamarei
corrilhos políticos, que não representam nenhum dos grandes princípios constitucionais».
Esta era a opinião que defendia como deputado «independente», «porque não me
acho ligado a grupos políticos de qualidade nenhuma» (30.7.1868). A questão da
desamortização, porém, deu origem a alguma aproximação ao Governo, pois votou
um projecto que recusara ao governo de Ávila, embora apresentasse propostas
restritivas quanto à aplicação das verbas obtidas e as fizesse depender da
sanção parlamentar (7.8.1868). No conturbado início parlamentar e político de
1869, marcado pela «emboscada da presidência» e pela demissão do Governo,
Mardel Ferreira manifestou-se a favor da urgente retomada da publicação
autónoma das
sessões
parlamentares (até aí insertas no Diário do Governo) porque «atendendo
às graves circunstâncias que se estão dando» era preciso «dar publicidade a
tudo quanto se passa no centro da representação nacional» (4.1.1869).
Perante
a demissão da presidência do parlamento, na sequência da chamada «moção
dos 44», propôs que se nomeasse uma comissão para apreciar os motivos
invocados, proposta que foi aprovada. Veio a ser eleito para essa
comissão,
que rejeitou as razões dos demissionários e convidou o presidente e vice-presidente
da Câmara dos Deputados a reocuparem os respectivos lugares (21.1.1869). Na
mesma sessão pronunciou o mais importante discurso político, que marcou
igualmente o fim da sua carreira parlamentar. De facto, tratou-se um discurso
violento que disparou em várias direcções e não poupou a actuação política do
Parlamento e do Governo que, depois de se demitir, aceitou ao fim de quase três
semanas continuar em funções. Denunciou a atitude dúplice da Câmara dos
Deputados por ter votado a «moção dos 44» e recriminou os que «promoviam por
todos os meios ao seu alcance manifestações que fora desta casa eram chamadas a
expressão da vontade nacional, denegando o seu próprio direito de serem aqui os
legítimos representantes da vontade do país». Censurou também a habilidade do
Governo por ter enganado a oposição e até os seus amigos, demitindo-se para
reemergir depois de pressões várias sobre o poder moderador. Após as críticas
arrasadoras, passou à afirmação da sua posição. Declarou que quando o Governo
tomou posse, ele próprio se declarara «nem oposição, nem ministerial», e assim
continuara sempre em defesa dos princípios constitucionais, e que pugnava por
moralidade, economias e «inteligência nessas economias», isto é, «queremos
reformas úteis e não queremos a anarquia em todos os serviços e não queremos medidas
revolucionárias». Admitia que, caso a situação política se agravasse, deixaria
«de ser conservador, também hei-de ser revolucionário, hei-de ir à praça,
hei-de pagar o azar da minha sorte na defesa dos meus princípios». Terminou o
discurso com a entrega de uma proposta para o Parlamento aguardar a «resolução
da crise com a reserva que lhe impõe os preceitos constitucionais, respeitando
as prerrogativas da Coroa, sem abdicar os seus legítimos direitos como poder
constituído».
11.
António Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti (1843-1912).
Deputado
eleito por Sintra em 1879, 1887, 1889, 1897, 1899 e 1900
Nasceu
em Colares, no concelho de Sintra, a 21 de Fevereiro de 1843 e faleceu em
Lisboa a 10 de Maio de 1912. Era filho do comendador António Mazziotti Júnior,
de que já falei, e de Maria do Carmo Zeferino de Azambuja Dias Pereira Chaves,
filha de um afilhado do marquês de Pombal. O padrinho de baptismo o 3.º conde
da Lousã, D. Diogo de Meneses Ferreira de Eça, ministro de D. João VI e de D.
Miguel.
Chaves
Mazziotti seguiu as pisadas do pai - atingiu a posição de maior contribuinte do
concelho de Sintra - e foi uma personalidade destacada na vida social local.
Participou na fundação do antigo Jornal de Cintra (1885), primeiro periódico
da era moderna da imprensa sintrense, era sócio da Sociedade União Sintrense,
membro da Misericórdia local e um dos fundadores dos Bombeiros de Colares. Foi
o maior entusiasta do nascimento da Praia das Maçãs, integrando a comissão que
desde 1884 lançou a construção da estrada do Banzão à nova localidade e
presidindo à «Sociedade Edificadora» constituída para o progresso da Praia das
Maçãs. Pertenceu à Real Associação Central da Agricultura Portuguesa (17.5.1869
a 10.4.1877) e faz parte da direcção desta associação em 1872. Possuía várias
comendas nacionais e estrangeiras, o título de fidalgo-cavaleiro da Casa Real
(5.2.1877) e foi agraciado com a carta de Conselho em 1910.
Casou
com Heloísa de Almeida e Albuquerque, filha de Luís de Almeida e Albuquerque,
fundador do Jornal do Comércio e director da Escola Politécnica.
Entrou
na política aos 16 anos, filiando-se no Partido Histórico (20.1.1860), e foi
depois figura proeminente do Partido Progressista. Detinha o n.º 3 na lista de
filiados de Lisboa, logo a seguir a José Luciano de Castro e a D. Miguel Pereira
Coutinho e pagava a mais avultada quota (mil réis mensais), além de se afirmar
como o maior influente político no concelho de Sintra. Durante 17 anos
pertenceu à Junta Geral do Distrito de Lisboa e, em representação da Câmara dos
Deputados e do Governo, substituíu Wenceslau de Lima (alta figura regeneradora
que chegaria a primeiro-ministro) como vogal e secretário da Junta de Crédito
Público.
A
correspondência que permaneceu no seu espólio traduz especiais relações de
amizade pessoal e política com Augusto Fuschini, Pedro Franco, conde do Restelo
e Mariano de Carvalho, a quem na Câmara dos Deputados, mesmo depois deste se
ter afastado do Partido Progressista, não deixou de elogiar como a «melhor
cabeça do país» (4.2.1904). No plano eleitoral, foi pela primeira vez candidato
a deputado em 1878, apresentando- se no círculo uninominal de Sintra, mas foi
derrotado por Francisco Joaquim da Costa e Silva, que anteriormente já vencera
seu pai. Em 1879 voltaram a defrontar-se, mas desta vez a vitória coube a
Chaves Mazziotti que veio novamente a representar o círculo de Sintra em
resultado das eleições de 1887, 1889, 1897, 1899 e 1900 (juramento a 14.1.1880,
13.4.1887, 15.1.1890, 30.6.1897, 16.1.1900 e 7.1.1901, respectivamente). Em
1886 chegou ao Parlamento como deputado por Beja, vencendo uma eleição
suplementar (juramento a 31.3.1886). A partir de 1901 e até à última eleição monárquica,
em 1910 (exceptuando a de Abril de 1906), com a inclusão de Sintra no círculo
plurinominal de Lisboa ocidental (lei eleitoral de 1901), passou a ser eleito
nesta circunscrição (juramento a 18.3.1902, 4.10.1904, 10.4.1905, 2.10.1906 e
2.5.1908, respectivamente). Na Câmara dos Deputados participou em diversas
comissões, pertencendo à Comissão de Agricultura em nove sessões legislativas.
Quanto às intervenções no plenário foram em grande medida centradas nos
problemas do seu círculo eleitoral: cobrança de impostos, caminho de ferro,
organização da justiça, financiamento da construção de repartições públicas,
questão da filoxera, crise vinícola, acção do administrador do concelho, criação
de escolas, conservação e construção de novas estradas, apoio à instalação e
exploração da iluminação eléctrica, etc. No plano da política geral destaque
para propostas e projectos de lei sobre sociedades anónimas a inserir no Código
Comercial (20.2.1888); de alteração de um artigo do Código Administrativo
(23.5.1888); de manutenção do círculo eleitoral de Sintra sem agregação do
concelho de Cascais,
zona onde detinha reduzida influência política (4.7.1899); de fornecimento pelo
Estado do bronze necessário à construção da estátua a Afonso de Albuquerque
(7.6.1899); de proibição do uso de margarinas ou outras substâncias no fabrico
de manteiga (27.5.1903) e sobre a fiscalização da denominação de origem dos
vinhos (29.1.1907). Chaves Mazziotti não produziu nenhum discurso de fundo, não
discutiu qualquer das
grandes questões políticas no parlamento, nem foi relator de qualquer parecer
de comissão. Manifestamente não possuía dotes oratórios, limitava-se a
curtas intervenções e a pequenos textos de fundamentação dos seus projectos
de lei. Como momentos altos na sua carreira de deputado poderão destacar-se
1899, quando efectuou o maior número de intervenções no hemiciclo; a sessão de
8.3.1901, quando quebrou a sua proverbial solicitude e interrompeu o primeiro-ministro
Hintze Ribeiro, contradizendo a explicação sobre um conflito entre polícias e
estudantes na Escola Politécnica, e a sessão de 29.1.1904 quando se manifestou
contra um emergente sinal do progresso técnico ao defender o fim dos «passeios
de automóveis pelas ruas da cidade de Lisboa» porque «ninguém se utiliza de um
automóvel para fazer compras ou visitas». Depois do 5 de Outubro manteve-se
fiel ao ideal monárquico, mas afastou-se da política. Frequentava os cafés,
como o Baltresqui e a Havaneza do Chiado, onde passava horas em amena
cavaqueira e tendo por vezes ditos espirituosos que faziam época, um estilo que
nunca patenteou enquanto deputado.
12.
Júlio César Pereira de Melo (?-?).
Deputado
eleito por Sintra em 1881
Nasceu
em Lisboa e era filho de Joaquim José Pereira de Melo. Formou-se em
Direito em 1865 e da sua carreira profissional apenas se sabe que nos anos
de 1870 e 1880 do século XIX exerceu o cargo de adjunto do enfermeiro- mor do
Hospital de S. José (presumivelmente um cargo administrativo), para além de ter
escritório de advogado em Lisboa.
Como
candidato do Partido Regenerador, foi eleito deputado em 1881 (juramento em
20.1.1882). Integrou a Comissão de Estatística nas sessões legislativas de 1882
e 1883. As suas intervenções no Parlamento foram raras. Das treze vezes em que
usou da palavra, para além da apresentação de representações de particulares,
interveio quase sempre para se referir a questões relacionadas com o
funcionamento do Hospital de S. José. Sobre os interesses dos concelhos de
Sintra e Cascais pronunciou-se apenas em três ocasiões: para defender a
elevação da alçada dos juízes de Cascais (25.2.1882); para apresentar
representações dos habitantes de Sintra e Cascais relativa à proposta de lei
sobre aguardentes de cereais (20.5.1882) e para apresentar uma representação de
moradores de Sintra contra o Orçamento da Câmara Municipal.
13.
António de Sousa Pinto de Magalhães (1837-?).
Deputado
eleito por Sintra em 1884
Nasceu
a 16 de Janeiro de 1837 em Lisboa, não sendo conhecida a data e local
da sua morte. Era filho de Maria Luísa de Andrade Calvet e do conselheiro António
de Sousa Pinto de Magalhães, director da Alfândega das Sete Casas.
Presumivelmente por influência paterna, conseguiu colocação como funcionário do
Ministério da Fazenda em 1856, foi reverificador da Alfândega de Lisboa e mais
tarde administrador do Círculo Aduaneiro do Sul. No exercício dessas funções
fez publicar diversos relatórios com abundantes dados sobre os serviços
aduaneiros e interessantes estatísticas dos consumos de Lisboa.
Membro
do Partido Regenerador, foi eleito deputado pelos círculos uninominais de Soure
(1878 e 1881) e de Sintra (1884) e pelo círculo plurinominal de Beja em 1901 e
1904. Por duas vezes foi eleito par do Reino, em representação do distrito de
Viseu em 1890 e em 1894.
Na
Câmara dos Deputados integrou as comissões de Comércio e Artes (1879, 1882,
1883 e 1885), Orçamento (1882 a 1884 e 1903), Fazenda (1885, 1886,1893, 1896 e
1902 a 1904), Negócios Estrangeiros (1882 a 1885), Obras Públicas (1885),
Estatística (1885), Inquérito sobre o imposto do sal (1885), Bill de
Indemnidade (1902 e 1904) e Ultramar (1903). A maioria das intervenções versou
problemas económicos e alfandegários, naturalmente aqueles que melhor conhecia,
e só muito raramente se interessou por assuntos locais, certamente por se
tratar de um deputado sem influência eleitoral, mas com competência técnica,
que interessava à direcção do partido fazer eleger por círculos onde a eleição
não corria perigo. Por esse motivo ter-se-á limitado a propor a transferência
de duas freguesias do concelho de Soure para o de Montemor-o-Velho (28.3.1879)
e a apresentar um requerimento do Asilo de Sintra com vista a obter um subsídio
(31.1.1885). No seu primeiro discurso (11.2.1879) chamou a atenção do ministro
da Fazenda para os perigos da importação de vinho espanhol eventualmente
contaminado, como já fora detectado na Galiza e em França, e contestou a
isenção de imposto de consumo sobre o vinho importado, colocando-o em vantagem
perante o vinho nacional. E toda a restante vida parlamentar girou em torno
destes problemas: os direitos do cordame e dos chapéus de chuva (7.5.1879); a
apreensão de tabaco numa fábrica (23.3.1882); os artigos da pauta sobre géneros
de consumo (8.3.1882); os prazos de armazenagem na Alfândega (10..4.1882); a defesa
da proposta de Orçamento do Estado (6.4.1883); os projectos de lei de alteração
do art.º 179.º da Pauta Geral (24.4.1883) e outros relativos aos direitos sobre
as madeiras serradas (19.3.1884) e os pavios de algodão (14.4.1884); a defesa
da autorização legislativa para a reforma das alfândegas (8 e 24.3.1884); a
urgência de obras no edifício da Alfândega de Lisboa (26.3.1884); as propostas
de adopção do modelo inglês de medição das embarcações (21.1.1885) e de redução
dos direitos de importação do bacalhau (22.5.1885); o tratado de comércio com a
Espanha (29.5.1885), no seu entender muito vantajoso, em especial para o
combate ao contrabando. Fora do âmbito estritamente económico pronunciou-se
ainda sobre a estação de saúde do Bom Sucesso, em Lisboa (24.4.1882), os
problemas da emigração insular (3.5.1882) e a reforma da instrução secundária
(10.5.1882). O regresso à Câmara dos Deputados em 1902 já não teve o fulgor das
primeiras legislaturas e restringiu-se então à entrega de requerimentos,
representações e pareceres de comissões. Ao longo da vida parlamentar apenas
por uma vez abandonou a sua postura essencialmente técnica e derivou para uma
opinião mais «política» (11.3.1885), quando respondeu a críticas de Mariano de
Carvalho à reforma das alfândegas e registou a mudança de atitude dos
progressistas.
Considerou-os
então mais afoitos e aguerridos, em virtude de já ter passado o acordo das
reformas políticas (1883-1884) e de os resultados eleitorais de
1884 os terem confirmado como o partido alternante no sistema rotativista.
Na
câmara alta pertenceu às comissões da Fazenda (1890 a 1894) e do Comércio e
Indústria (1894). As questões económicas e pautais dominaram, também aqui, as
suas intervenções, mas há que registar a expressão do seu pensamento económico.
Na discussão sobre os tabacos (2.8.1890), explicou «que não é função do Estado
o dirigir qualquer indústria, devendo deixar livre a sua exploração à
actividade dos cidadãos» e que em 1864 exultara com o fim do monopólio, todavia
em 1890 impunha-se defendê-lo face ao fracasso da régie e às
necessidades do Estado em arrecadar receitas. Dois anos mais tarde, assumiu o
carácter vincadamente proteccionista da Pauta (23.3.1892),decorrente de estudos
efectuados desde 1887 e não apenas por pressão da tendência europeia da época.
Defendeu a opção pela pauta máxima para se poder negociar convenções e como
forma de corresponder às necessidades da situação em que se encontrava a
indústria nacional. Na resposta às objecções do conde de Castro, que se
declarara livre-cambista, afirmou: «insisto em não declarar a escola económica
que professo. Não faço profissão de fé económica, a fazer alguma faria a que
aqui foi pronunciada pelo ilustre professor já falecido Aguiar, seguindo a
escola sensatista».
14.
António Máximo de Almeida Costa e Silva (1847-1920), 5.º conde de Ficalho.
Deputado
eleito em 1890, 1892 e 1894
Nasceu
a 3 de Julho de 1847 e morreu a 11 de Novembro de 1920. Era filho de Francisco
Joaquim da Costa e Silva, deputado e par do Reino, e de Margarida Helena de
Almeida e Costa, sendo neto paterno do par do Reino, António da Costa e Silva,
1.º visconde de Ovar. Casou com Maria Josefa de Melo, 5.ª condessa de Ficalho
(2.6.1888), pelo que era genro do par do Reino, Francisco Manuel de Melo
Breyner, 4.º conde de Ficalho. O 5.º conde de Ficalho era oficial-mor da
Casa Real e foi nomeado adido à embaixada em Roma a 4.5.1883. Foi deputado,
eleito em 1890, 1892 e 1894 pelo círculo uninominal de Sintra, integrando a
lista dos Regeneradores, e participou nas legislaturas de 1890-1892, 1893 e
1894. Fez parte da Comissão da Fazenda, (1891, 1892 e 1893) e da Comissão de
Petições (1890). Sucedeu ao pai no lugar de par do Reino (6.2.1902). Na câmara
alta pertenceu às comissões do Ultramar (1904), de Paz e Arbitragem (1904, 1905
e 1909), Comércio e Indústria (1905 e 1906), de Verificação de Poderes (1906 a
1908) e de Petições (1906). Em 1902 apresentou um projecto de lei para autorizar
o dispêndio da verba necessária para adquirir um busto em mármore ou bronze do
professor Manuel Bento de Sousa, a ser colocado no edifício da Escola
Médico-Cirúrgica. Em 1905 declarou pertencer ao Partido Regenerador-Liberal. No
ano seguinte (5.10.1906) requereu que pela estatística da Alfândega do Porto,
lhe fosse enviada a certidão do número de pipas com vinhos exportados pela
barra do Porto, com a designação de vinho de Colares; pela fiscalização do
Governo junto do caminho-de-ferro do Norte e Leste, lhe fosse enviada uma nota
com o número de cascos de vinho de Torres, ou outra qualquer procedência,
despachados para a estação de caminho-de-ferro de Sintra.
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