terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Abate de árvores: que podem os cidadãos fazer?


A decisão das associações e particulares envolvidos na luta contra o abate não cirúrgico de árvores em Colares e na estrada de Sintra, em geral, originou por parte das mesmas uma participação ao Ministério Público, que deverá abrir um inquérito, e verificar da existência de ilícito penal ou vício de acto administrativo por parte de quem ordenou a medida e seus fundamentos, nos termos da legislação em vigor e do Código do Procedimento Administrativo.
Posteriormente ou mesmo até autonomamente, podem, se assim o desejarem, as ditas associações e particulares na concretização do estado de Direito democrático e para protecção dos interesses difusos que a defesa do ambiente globalmente prevê lançar mão da denominada acção popular, consagrada na nossa Constituição, nomeadamente no seu artº 52º como forma de democracia directa e participativa, extensível a particulares e organizações, e na Lei n.º 83/95, de 31 de Agosto, sendo que os interesses a proteger são, nomeadamente, a saúde pública, o ambiente, a qualidade de vida, a protecção do consumo de bens e serviços, o património cultural e o domínio público.
São titulares do direito procedimental de participação popular e do direito de acção popular, entre outros, quaisquer cidadãos no gozo dos seus direitos civis e políticos e associações e fundações defensoras desses interesses, independentemente de terem ou não interesse directo na demanda. Constituem requisitos da legitimidade activa das associações e fundações terem personalidade jurídica; incluírem expressamente nas suas atribuições ou nos seus objectivos estatutários a defesa dos interesses em causa no tipo de acção de que se trate; não exercerem qualquer tipo de actividade profissional concorrente com empresas ou profissionais liberais. A acção procedimental administrativa compreende a acção para defesa dos interesses referidos e o recurso contencioso com fundamento em ilegalidade contra quaisquer actos administrativos lesivos dos mesmos interesses.
A petição deve ser indeferida quando o julgador entenda que é manifestamente improvável a procedência do pedido, ouvido o Ministério Público e feitas preliminarmente as averiguações que o julgador tenha por justificadas ou que o autor ou o Ministério Público requeiram. Recebida petição de acção popular, serão citados os titulares dos interesses em causa na acção de que se trate, e não intervenientes nela, para o efeito de, no prazo fixado pelo juiz, passarem a intervir no processo a título principal, querendo, aceitando-o na fase em que se encontrar, e para declararem nos autos se aceitam ou não ser representados pelo autor ou se, pelo contrário, se excluem dessa representação, nomeadamente para o efeito de lhes não serem aplicáveis as decisões proferidas, sob pena de a sua passividade valer aceitação. A citação será feita por anúncio ou anúncios tornados públicos através de qualquer meio de comunicação social ou editalmente, consoante estejam em causa interesses gerais geograficamente localizados, sem obrigatoriedade de identificação pessoal dos destinatários, que poderão ser referenciados enquanto titulares dos mencionados interesses, e por referência à acção de que se trate, à identificação de pelo menos o primeiro, autor, quando seja um entre vários, do réu ou réus e por menção bastante do pedido e da causa de pedir. Quando não for possível individualizar os respectivos titulares, a citação prevista no número anterior far-se-á por referência ao respectivo universo, determinado a partir de circunstância ou qualidade que lhes seja comum, da área geográfica em que residam ou do grupo ou comunidade que constituam, em qualquer caso sem vinculação à identificação constante da petição inicial. O Ministério Público fiscaliza a legalidade e representa o Estado quando este for parte na causa, os ausentes, os menores e demais incapazes, neste último caso quer sejam autores ou réus. Cabe ao juiz iniciativa própria em matéria de recolha de provas, sem vinculação à iniciativa das partes.
Mesmo que determinado recurso não tenha efeito suspensivo, nos termos gerais, pode o julgador, em acção popular, conferir-lhe esse efeito, para evitar dano irreparável ou de difícil reparação.As sentenças transitadas em julgado proferidas em acções ou recursos administrativos ou em acções cíveis, salvo quando julgadas improcedentes por insuficiência de provas, ou quando o julgador deva decidir por forma diversa fundado em motivações próprias do caso concreto, têm eficácia geral, não abrangendo, contudo, os titulares dos direitos ou interesses que tiverem exercido o direito de se auto-excluírem da representação.
As decisões transitadas em julgado são publicadas a expensas da parte vencida e sob pena de desobediência, com menção do trânsito em julgado, em dois dos jornais presumivelmente lidos pelo universo dos interessados no seu conhecimento, à escolha do juiz da causa, que poderá determinar que a publicação se faça por extracto dos seus aspectos essenciais, quando a sua extensão desaconselhar a publicação por inteiro.
Pelo exercício do direito de acção popular não são exigíveis preparos. O autor fica isento do pagamento de custas em caso de procedência parcial do pedido. Em caso de decaimento total, o autor interveniente será condenado em montante a fixar pelo julgador entre um décimo e metade das custas que normalmente seriam devidas, tendo em conta a sua situação económica e a razão formal ou substantiva da improcedência. A responsabilidade por custas dos autores intervenientes é solidária, nos termos gerais. A responsabilidade por violação dolosa ou culposa dos interesses protegidos constitui o agente causador no dever de indemnizar o lesado ou lesados pelos danos causados.A indemnização pela violação de interesses de titulares não individualmente identificados é fixada globalmente. O direito à indemnização prescreve no prazo de três anos a contar do trânsito em julgado da sentença que o tiver reconhecido.
Existe ainda a obrigação de indemnização por danos independentemente de culpa sempre que de acções ou omissões do agente tenha resultado ofensa de direitos ou interesses protegidos nos termos da presente lei e no âmbito ou na sequência de actividade objectivamente perigosa.Sempre que o exercício de uma actividade envolva risco anormal para os interesses protegidos pela presente lei, deverá ser exigido ao respectivo agente seguro da correspondente responsabilidade civil como condição do início ou da continuação daquele exercício, em termos a regulamentar.
Aos titulares do direito de acção popular é reconhecido o direito de denúncia, queixa ou participação ao Ministério Público por violação dos interesses previstos no artigo 1.º que revistam natureza penal, bem como o de se constituírem assistentes no respectivo processo, nos termos previstos no  Código de Processo Penal.
É dever dos agentes da administração central, regional e local, bem como dos institutos, empresas e demais entidades públicas, cooperar com o tribunal e as partes intervenientes em processo de acção popular. As partes intervenientes em processo de acção popular poderão, nomeadamente, requerer às entidades competentes as certidões e informações que julgarem necessárias ao êxito ou à improcedência do pedido, a fornecer em tempo útil.
A recusa, o retardamento ou a omissão de dados e informações indispensáveis, salvo quando justificados por razões de segredo de Estado ou de justiça, fazem incorrer o agente responsável em responsabilidade civil e disciplinar.
Este o quadro global, e no cerne da questão, em minha opinião, está em primeiro lugar distinguir se os actos denunciados são da esfera do direito penal ou dos vícios do acto administrativo(o despacho ou autorização que determina as podas e seus fundamentos ,nos termos do art 125º do CPA, sendo que a fundamentação não pode ser per relationem ou ser vaga e imprecisa, ainda que assente em relatório técnico específico, isto é a vacuidade não pode consubstanciar um acto administrativo válido por vício de violação de lei-a falta de fundamentação clara e expressa, sendo que na ponderação de interesses o direito à imagem e a defesa do ambiente devem igualmente ser tidos em conta, atento o princípio da proporcionalidade.
Mas isto são apenas considerações académicas desgarradas do processo, meramente informativas para os potenciais leitores e para os interessados na concretização do estado de Direito e da cidadania adulta e interventiva. O grande óbice é ainda a falta de tradição entre nós(na Alemanha ou Holanda é frequente) e os custos, se o Ministério Público entender não existir matéria para intervir, caso em que os interessados associações e particulares deverão ponderar as despesas e custas e procuradoria, muitas vezes desmotivadores de acção judicial.
Fernando Morais Gomes

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