sábado, 22 de dezembro de 2012

Francisco Costa por Miguel Real



Francisco Costa (1900-1987) é o único escritor genuinamente sintrense: nasceu, foi baptizado, casou, viveu, trabalhou e morreu em Sintra. Na sua actividade profissional e estética, privilegiou sempre Sintra, seja enquanto romancista, seja enquanto historiador. Trabalhou durante longos anos como contabilista na Adega Regional de Colares e, em 1939, mercê de um curso de bibliotecário que tirara no final do liceu, transitou para a Câmara Municipal de Sintra, onde fundou a Biblioteca e o Arquivo Municipal, então instalados no Palácio Valenças, na Vila Velha.

Após dois anos de convalescença devido à febre pneumónica que assolara o país em 1917/18, Francisco Costa publica o seu primeiro livro de poemas, , em 1920, recebendo louvores críticos de Ferreira de Castro. Posteriormente, em 1925, publica Verbo Austero, que colhe os favores de Fidelino de Figueiredo, crítico literário classicista, e do modernista Fernando Pessoa, que lhe pede alguns poemas para a sua revista Athena. Neste livro, é publicado o soneto "Cruz Alta", actualmente inscrito no cume da Serra da Sintra.

Estilisticamente, a poesia e a prosa de Francisco Costa são profundamente clássicos e ele próprio, no prefácio a Algemas de Ouro, de 1933, regista as suas ideias anti-modernistas.

Abandonando a poesia (a que apenas regressará em 1987, em Última Colheita), Francisco Costa dedica-se ao romance, publicando a primeira trilogia na década de 40: A Garça e a Serpente, em 1943, Primavera Cinzenta, em 1944, e Revolta de Sangue, em 1946. Romance de estreia e considerado um dos seus melhores textos narrativos, A Garça e a Serpente foi galardoado com o Prémio Literário Eça de Queirós.

A sua luta ideológica e literária contra o modernismo prossegue com a conferência Velhice do Modernismo, em Coimbra, em 1945. No ano do centenário da morte de Eça de Queirós, 1945, Francisco Costa publica o polémico ensaio Eça visto por si próprio, um diálogo de Eça consigo próprio no ambiente da Serra de Sintra. Prolongando o seu cunho ensaístico, Francisco Costa tematiza a sua arte de escrita em Essência e Existência do Romance, em 1953. Porém, é em Cárcere Invisível, publicado em 1949, que Francisco Costa atinge a sua máxima mestria estilística e narrativa, tendo recebido o prestigiadíssimo prémio literário Ricardo Malheiros da Academia das Ciências de Lisboa.

Ideologicamente, a crítica literária atribui um fundo católico aos romances de Francisco Costa, embora o padre João Mendes, crítico literário da revista Brotéria, revista dos jesuítas portugueses, condene Francisco Costa por não ser suficientemente católico, dando acolhimento nas suas narrativas a temas como o divórcio, a culpa excessiva e o sentimento de descrença religiosa entre a juventude. Paradoxalmente, outros críticos literários, como João Gaspar Simões, criticam Francisco Costa por ser excessivamente católico.

Na década de 50, Francisco Costa publica a segunda trilogia, a que dá o título geral de "Em Busca do Amor Perdido": Acorde Imperfeito, de 1954, Nocturno Agitado, de 1955, e Cântico em Tom Maior, também publicado em 1955.

Em 1964, publica o romance Escândalo na Vila e em 1973 Promontório Agreste, integralmente passado entre Cascais e Sintra, retratando a aristocracia e a alta burguesia das duas vilas.

Miguel Real (21.03.2007)

Estrangeiros em Sintra



A beleza e mistério de Sintra desencadeou a partir sobretudo a partir do final do séc XVIII uma busca por parte de estrangeiros a fixar-se por estas bandas, sobretudo por parte dos ingleses, e decorrente da relação próxima que Portugal teve com esse país depois da deslocação da corte para o Brasil. Uns viajantes (Byron, Lady Jackson, Ratazzi) outros moradores (Jane Lawrence, os Cook, Gildmeester) aqui deixamos uma pequena viagem por alguns dos estrangeiros que se apaixonaram e fixaram em Sintra.

BECKFORD

Em 1787, o milionário e dandy inglês William Beckford, proscrito de Inglaterra por amores proibidos instalou-se em Portugal, tendo no seu Diário, publicado em 1954 dedicado largas páginas aos episódios aqui vividos. Desde proscrito pelo embaixador inglês Walpole, que o desprezava pelo seu passado promíscuo, até à amizade com os marqueses de Marialva, que com ele quiseram casar uma filha (embora ele preferisse o filho...) em clima byroniano podemos situar a presença do "louco de Fonthill" em terras de D.Maria I, suas relações com D.Diogo, 5º marquês de Marialva e estribeiro-mor do Reino, as vilegiaturas no Ramalhão e em Monserrate (onde viveu numa das três viagens a Portugal).
Autor de"The history of the caliph Vatek", publicado em 1786, Beckford, pela sua vida diletante e pecaminosa é daquelas figuras proscritas e amadas simultâneamente,pela evocação da luxúria e excessos. O pai fora duas vezes mayor de Londres, e era um dos mais ricos homens de Inglaterra. Beckford, falante de sete línguas, tivera uma educação esmerada,e não fora os amores pecaminosos com William Courtenay (apesar de ter casado e tido duas filhas) e nunca teria deixado a fechada sociedade inglesa, de onde esteve afastado durante mais de 10 anos, vários dos quais residiu em Portugal, e em Sintra em particular. Beckford/Vatek foi pois um pigmaleão mutante, dandy viajado,"o forasteiro rico", como entre nós ficou conhecido como figura destacada num Portugal provinciano do pós terramoto nas vésperas das invasões napoleónicas.

BYRON E HOBHOUSE

Quando se fala de Sintra no sec XIX a figura mais recorrente é a de Byron, que no Lawrence Hotel terá escrito parte do seu Child Harold Pilgrimage, onde dedica uns versos a Sintra:

"Lo! Cintra's glorious Eden intervenes

In variegated maze of mount and glen.

Ah me! what hand can pencil guide, or pen,

To follow half on which the eye dilates

Through views more dazzling unto mortal ken

Than those whereof such things the bard relates,

Who to the awe-struck world unlocked Elysium's gates?"


Porém, consigo viajou em 1809 um outro inglês, John Cam Hobhouse, que nos deixou um relato da sua visita a Sintra, no âmbito dum diário de viagem escrito em latim, e de que respingamos extractos, traduzidos em português:
2ªF, 12 de Julho de 1809"-Fui com Marsden de caleche até Sintra, numa estrada com muitas curvas, três jugos de vinho,pão e queijo e trinta dinheiros. Vimos o palácio de Marialva em Sintra e os jardins de Monserrate, antes propriedade do sodomita inglês Beckford, agora deserto e sem mobília. Entretanto, Byron foi a Mafra visitar o palácio e convento ,onde antes da invasão francesa os frades eram 150 e agora só 30 (...)Jantei em Sintra com três clérigos Scott, Simmons e Turner e passei lá a noite"
3ªF, 13 de Julho de 1809-"De burro, fomos a Nossa Senhora da Pena,ao mosteiro de S.Jerónimo onde vivem 4 monges, pobres mas não mal vestidos. E ao Cork Convent (Capuchos?) na parte mais alta da região, com 17 franciscanos que não comiam carne nem bebiam vinho e se flagelavam. Mostraram-nos uma cave no jardim (...) o seu abade pôs-nos queijo e laranjas numa mesa de pedra. Descemos então das alturas e visitámos Colares, bela vila, com vinho abundante, clarete, e tornámos a Monserrate, um palácio só excedido pelo de Marialva em Sintra. Aí jantámos com o bom reverendo Turner. Noite em Sintra".
4ªF, 14 de Julho de 1809-"-Fomos visitar com Byron, e por sugestão da irmã de Marialva, o seu palácio, ricamente decorado em estilo inglês (Seteais) e estivemos na sala onde a famosa Convenção (#) foi assinada e vimos um mosteiro do lado oposto. Dissemos adeus a Sintra, onde havia no hotel vários hóspedes embriagados e uma mulher suja irlandesa nos entregou uma monstruosa conta de 40 dollars e meio (...) Lendo acerca de Sintra, descubro que a humidade é causada por exalações de vapor"

Depois, foi o regresso a Lisboa e ao navio inglês, e ás revistas da R.dos Condes. Terá sido por estes dias, e na companhia de Hobhouse que Byron escreveu os célebres versos.

FRANCIS COOK

A última leva de grandes senhores de Monserrate pertenceu aos ingleses, e à família Cook, em particular. Francis Cook, rico empresário têxtil, desembarcou em Lisboa em 1841, e aqui se apaixonou e casou com Emily Martha, filha do comerciante Robert Lucas. Depois de alguns anos em Inglaterra, adquiriu Monserrate, e aqui se estabeleceu a partir da década de 60 de oitocentos. Em 1870 foi feito Visconde de Monserrate por D.Luís I. Adquirido o edifício, grandes obras se realizaram sob a orientação do arquitecto inglês James Knowles, e pouco ficou da traça de De Visme. Mas as grandes mudanças foram ao nível dos jardins, começados por Sir Francis e o seu jardineiro Burt, importando espécies de todo o mundo que rivalizavam com os jardins de D.Fernando, na Pena, quer já no tempo de Sir Herbert nos anos 20,com outro entendido, Walter Oates, que escreveu em 1929 um livro sobre os jardins de Monserrate, The Gardens Chronicle.
A partir de 1928,o poderio dos Cook feneceu, e começou o período decadente. Em 1947, o filho de Sir Herbert, Sir Francis, bisneto do 1º visconde, vendeu a propriedade a um tal Saul Saragga, o qual queria construir um empreendimento com 143 lotes (!)no local. Foi aí que o Estado Português, avisado por Flávio Resende, director do Jardim Botânico de Lisboa, adquiriu a propriedade, por cerca de nove mil contos. A partir daí, tudo se desvaneceu: o recheio vendido em leilão, e os jardins entregues aos Serviços Florestais. Até então,quatro gerações de Cook viveram e deixaram marcas no delicious Eden. Joly good!

TEMPOS MODERNOS

Nos dias de hoje muitos são os estrangeiros que adquiriram propriedades em Sintra, muitas de grande valor arquitectónico e simbólico.
Só um resumo: a Quinta da Capela, alugada a Marc Zurcher, suiço, a Quinta da Palma, alugada por americanos, a Quinta da Madre de Deus, de Michael John Baker, a Quinta do Vinagre, em Colares, da família Schumberger, a Quinta do Conde, em Colares, de Tinsley. E ainda a Quinta de S.João, de Jaime Senfelt, a Quinta de S.Tiago, de Eduard Bradell, a Quinta do Bonjardim, onde se jogou a primeira partida de futebol em Portugal,da família Empis.

Acrescente-se ainda a Quinta das Bochechas, da família Massetti, a Quinta do Alto Sereno, de Gerda Spitze, a Casa dos Pisões, de Julina Leacock, a Quinta da Boavista, do conde Frederico de Schonborn-Wiesentheid, a Quinta dos Moinhos Velhos, de Mrs Bosschaart, a Quinta de Penaferrim, de Richard Thomas, a Quinta do Monte Sereno, de Mark Berger, A Quinta do Arrabalde, do holandês Huits, a Quinta do Chão dos Arcos, de Roy Campbell. E outras, como a Quinta da Toca, a Quinta de santo António, em Almoçageme, a Quinta da Bemposta, a Quinta Biester, a Quinta dos Lagos (que pertenceu ao ex-presidente do Brasil, Sarney) etc.

Ainda Hotéis como o Lawrence e o Miramonte, em Colares pertencem a estrangeiros, como dos japonês Nishimura foi a Quinta da Regaleira até que a CMS a adquiriu. E muitos mais.

Sintra, a sua serra, mar e vasto património ainda hoje um Delicious Eden!

 

O Vinho de Colares

COMUNICAÇÃO AO III ENCONTRO DE HISTÓRIA DE SINTRA ORGANIZADO PELA ALAGAMARES- MAIO 2007
JOANA MACEDO



O vinho corporativo de Colares
A análise que aqui se apresenta prende-se a uma das mais emblemáticas instituições da região de Colares, a Adega Regional de Colares, cuja fundação teve lugar durante o Estado Novo. Nas linhas que se seguem analisaremos a fase de arranque da Adega de Colares (1931-1941): tendo em conta a sua fundação, os diplomas legais que a regeram, as suas funções, o seu contributo para o vinho regional de Colares e, finalmente, a sua passagem para uma esfera de acção mais próxima da Junta Nacional do Vinho.
A Adega Regional de Colares mereceu o nosso interesse pela acção que tem desenvolvido, ao longo dos anos, junto dos produtores de vinho da região de Colares e pela divulgação que tem feito do vinho de Colares, acção que leva a cabo ainda nos dias de hoje.
A agricultura como sector fulcral da economia salazarista
No plano económico, o Estado Novo ficou marcado por uma distinção do sector primário enquanto sector que mais população activa absorvia, sendo a actividade agrícola a que maior peso possuía em Portugal, revelando uma situação de atraso na modernização do País, situação somente alterada entre as décadas de 50 e 60, onde se revelou um salto no que respeita ao sector secundário.
O panorama agrícola apresentava algumas disfunções, sendo uma delas a predominância da pequena e da média propriedade, situação que não permitia uma boa rentabilidade da exploração agrícola, mas que servia os interesses de muitos, na medida em que “as pequenas explorações familiares eram uma fonte vital de mão-de-obra com o perfil ideal (dócil e barata).”1
A manutenção desta primazia da agricultura devia-se, em grande parte, ao lobby agrícola, ou seja, ao conjunto de grandes proprietários que se opunham fortemente ao desenvolvimento da indústria e à alteração do estado da própria agricultura, o qual se lhes afigurava favorável (como vimos no paragrafo anterior), como forma de manutenção do seu estatuto e interesses.
1 MARTINS, Fernando, “Visão sintética sobre as realidades estruturais e a sua evolução”, Nova História de Portugal, dir. Joel Serrão, A. H. Oliveira Marques, vol. XII, Portugal e o Estado Novo (1930-1960), coord. Fernando Rosas, Lisboa, Editorial Presença, 1992, p. 289.
Por outro lado, a manutenção da paisagem agrícola era uma primazia do Estado Novo, que considerava o mundo rural como o reduto dos verdadeiros valores portugueses, sendo assim “a florestação dos baldios ou o emparcelamento da pequena propriedade (tal como o parcelamento da grande) apresentavam-se quase sempre como algo “condenável” e “perigoso” por parte dos meios ruralistas.”2
A demanda, levada a cabo pelo Estado Novo, pela essência nacional encontraria terreno fértil na ruralidade, facto corroborado pelo mito da essencialidade rural do país 3, o qual se traduzia na realidade de um país essencialmente agrícola, constituindo o campo o bastião dos verdadeiros valores da nação: ordem, modéstia, religião, disciplina, tradição, em contraposição ao desvirtuamento dos mesmos, que ocorria nas cidades, detentoras de uma vida frenética fruto da industrialização e do urbanismo.
A indústria do vinho
Entre os produtos produzidos pelas indústrias ligadas à agricultura, como é o caso da cortiça, do azeite, das lãs ou do vinho, este último ocupava um lugar de destaque, juntamente com a cortiça, entre os produtos que maior relevo possuíam no que respeitava ao comércio, alcançando uma percentagem de 35% do total dos produtos exportados4. De acordo com Augusto Barbosa Estácio, “é a cultura da vinha o maior valor económico do País, dela vivendo 2 000 000 de portugueses, tantos são, os sustentados pelos 500 000 indivíduos que nela empregam a sua actividade.” 5. Ideia traduzida no slogan utilizado pela Junta Nacional do Vinho: “Beber vinho contribui para o pão de mais de um milhão de portugueses”6.
O panorama de produção e comercialização de vinho a esta escala era apenas possível devido às características geológicas e climatéricas de nosso País, as quais permitiam o cultivo de várias variedades de vinhas. Esta variedade deu origem à divisão do espaço português em regiões demarcadas, divisão essa estabelecida desde o início do
2 Id., Ibid., p. 290.
3 Para além dos referidos mitos, a axiologia do Estado Novo contemplava ainda o mito da essência ontológica do regime, o mito do império, o mito da pobreza honrada, o mito palingenético, o mito da ordem corporativa e o mito da identidade católica do país.
4 Vide: Decreto-lei n.º 19 253, Diário do Governo, n.º 15, I série, 19 de Janeiro de 1931, p. 165.
5 ESTÁCIO, Augusto Barbosa, “A indústria dos vinhos e seus derivados”, I Congresso da União Nacional. Discursos, teses e comunicações (Lisboa, 26 a 28 Maio de 1934), vol. VI, Lisboa, União Nacional, 1935, p. 169.
6 FREIRE, Dulce, “Vinho”, Dicionário de História do Estado Novo, dir. Fernando Rosas, J .M. Brandão de Brito, vol. II, Lisboa, Bertrand, 1996, p. 1011.
século XX através de diplomas legais datados de 1907 e 1908.7 . Nos diplomas de 1908 o vinho de tipo regional de Colares vem determinado como “o produzido em toda esta freguesia e nos terrenos de areia solta das freguesias de S. Martinho e S. João das Lampas do concelho de Cintra.”8 A comercialização do vinho de Colares seria igualmente alvo de regulamentação legislativa com a publicação de um decreto datado de 25 de Maio de 1910.
A importância desta produção, muito ao nível do comércio, conduziu o Estado Novo a reflectir sobre o aperfeiçoamento necessário das bases em que esta indústria devia repousar, lançando-se, de imediato, considerações sobre o estado da vitivinicultura nacional aquando do estabelecimento da ditadura. Feita uma análise chegou-se à conclusão de que “na parte que mais de perto se prende com a intervenção do Estado no fomento viti-vinícola nacional verifica-se a falta de um plano geral que compreendesse todo um programa de trabalhos a realizar. A produção era abandonada ao critério de cada qual, só procurando a escassa e deficiente assistência técnica oficial os raros viticultores que por acaso se interessavam por determinados aspectos culturais da vinha.”9 
A ausência de intervenção por parte do Estado Liberal nas diferentes estruturas que compunham a realidade portuguesa foi sempre uma constante crítica estado novista ao regime que o antecedeu, revelando a conduta estatal do novo regime ser oposta a esta situação, caracterizando-se por uma forte intervenção do Estado em todos os níveis, situação que se acentuou com a II Guerra Mundial.
Os princípios propostos para ultrapassar este período de crise da indústria do vinho consistiam na garantia da genuinidade do vinho produzido, através da fiscalização
e inspecção técnica. Perante o panorama de melhoria da indústria do vinho, foram lançadas as Bases do fomento vitivinícola. As referidas Bases dividiram o espaço nacional em nove zonas vitivinícolas: a do Norte Litoral, a de Trás-os-Montes e Douro, a da Beira Alta, a da Beira Litoral, a do Centro Litoral (onde está compreendida a região de Colares), a do Ribatejo, a do Alentejo, a do Algarve e a da Madeira. Cada uma destas zonas estava sob a orientação do Conselho Superior de Viticultura, para além de que em cada uma delas se
7 Vide: Decreto n.º 1, Diário do Governo, n.º 104, 11 de Maio de 1907; Diário do Governo, n.º 215, 24 de
Setembro de 1908; Diário do Governo, n.º 221, 1 de Outubro de 1908.
8 Art.º 9.º, Decreto, Diário do Governo, n.º 215, 24 de Setembro de 1908, p. 2927; Art.º 9.º, Carta de Lei,
Diário do Governo, n.º 221, 1 de Outubro de 1908, p. 2987.
9 Decreto-lei n.º 19 253, Diário do Governo, n.º 15, I série, 19 de Janeiro de 1931, p. 165.
estabeleceria uma estação vitivinícola e em cada região demarcada uma junta regional de viticultura e uma adega regional. Esta última dizia respeito “apenas aos viticultores das regiões demarcadas, e visa essencialmente à obtenção de um ou mais tipos definidos, característicos de vinhos regionais, cujo escoamento seja facilitado pela importância quantitativa dos vinhos fabricados”10.
Foi, desta forma, feita a apologia do lagar sindical defendendo-se a “sua vinificação em conjunto com as dos diferentes sítios da região de características um pouco diferentes, embora semelhantes, daria um tipo único que se poderia manter e um apreciador de um certo vinho sabia que o poderia sempre encontrar”11.
Outro dos problemas com que a indústria do vinho se debatia era a irregularidade das produções, ora abundantes ora deficitárias. Esta situação conduzia a uma instabilidade dos preços a que o vinho era vendido, demonstrando uma falta de organização entre os produtores e os comerciantes. Ou seja, “nos anos de sobre produção os vinicultores exercem até ao exagero a mútua concorrência, […], do que resulta que um bom ano vitícola se transforma em ano de escasso rendimento. Pelo contrário, nos anos de fraca produção os preços sobem a limites por vezes exagerados, desorganizandoo comércio, sem que, contudo, o produtor consiga uma remuneração capaz de ressarci-lo dos prejuízos dos anos anteriores ou de protegê-lo contra os futuros.”12
O controlo dos preços era de fulcral importância para uma regularização da exportação.

O enquadramento corporativo da indústria do vinho

No ano de 1933 é publicada a Constituição da República Portuguesa, na qual se assume, como característica do Estado Novo, o Corporativismo, posteriormente desenvolvido no Estatuto do Trabalho Nacional, datado, também ele, do mesmo ano da Constituição.
O Corporativismo foi a forma encontrada pelo regime de Salazar para alcançar a ordem e a disciplina, numa vertente económica, distribuindo a população activa por diferentes organismos, de acordo com o papel que desempenhavam, terminando, desta  
10 Art.º 24.º, Cap.º VII “Adegas regionais e adegas livres”, Decreto-lei n.º 19 253, Diário do Governo, n.º15, I série, 19 de Janeiro de 1931, p. 168. 11 ESTÁCIO, Augusto Barbosa, “A indústria dos vinhos e seus derivados”, I Congresso da União Nacional...., p. 172.
12 “Relatório referente aos decretos-leis n.º 23 230, 23 231, 23 232”, Diário do Governo, n.º 263, I série, 17 de Novembro de 1933, p. 2000.
forma, com as agitações sociais provocados pelas “disputas” entre patrões e trabalhadores. Ao Estado cabia o papel de mediador entre as duas “facções”, apelando para o “trabalho em equipa”, única forma de conseguir um equilíbrio social, e
consequentemente, uma manutenção do regime.
Esta aglutinação tinha como fim o diluimento do indivíduo naquela que se tornou a verdadeira e legítima busca – a do bem comum, a do bem da Nação, para a qual todos deviam contribuir.
O esquema corporativo assumiu uma forma piramidal, em cuja base se encontram os Elementos Primários: sindicatos nacionais, grémios, casas do povo e casas dos pescadores; no nível seguinte incorporavam-se os chamados Elementos Intermédios ou Secundários, os quais albergavam as Federações nacionais e regionais e Uniões; sendo o vértice constituído pelos Elementos Superiores, ou seja, as corporações, de cariz económico.
Entre os Elementos Primários destacam-se os sindicatos nacionais, organismos de reunião de trabalhadores das diversas áreas, fundados de acordo com a profissão; os grémios eram os organismos onde se incorporava o poder patronal; as casas do povo e dos pescadores, eram organismos onde se reuniam patrões e trabalhadores das zonas rurais e das zonas piscatórias, respectivamente.
O nível intermédio da pirâmide incorporava Federações, ou seja, associações de grémios ou sindicatos análogos e Uniões, ou seja, associações de actividades congéneres organizadas em sindicatos e grémios, com a finalidade de representarem de forma conjunta os interessados em amplos ramos de actividade nacional.
O último nível da pirâmide agrupava as Corporações, as quais integravam todos os demais elementos.
Relativamente ao cultivo e produção de vinho foram criados os grémios de viticultores, de inscrição obrigatória, que no caso de Colares foi assumido pela Adega Regional de Colares, como veremos mais adiante. A estes grémios acabariam por
suceder os Grémios da Lavoura, os quais abrangiam todas as culturas.
À Federação cabia a orientação e fiscalização da produção e comércio dos vinhos e 13 Decreto-lei n.º 23 231, de 17 de Novembro de 1933. outros produtos ligados à indústria vinícola, promover melhoramentos na produção dos vinhos e seus derivados, para além de auxiliar monetariamente os produtores de vinho.
Por seu lado, ao Grémio de Exportação de Vinhos e ao dos Armazenistas de Vinho competiam funções ligadas ao comércio deste produto, que passavam pela  certificação de origem dos vinhos a exportar, pela fixação de preços, entre outros.
No ano de 1936, publicou-se o regime jurídico dos chamados organismos de coordenação económica, “potentes máquinas da política do Estado Novo, a quem competiam funções gerais de disciplina e fiscalização e, ainda, funções específicas”14, que se traduziram em: comissões reguladoras, institutos e juntas nacionais. Perante esta nova realidade a Federação dos Viticultores do Centro e Sul do País deu lugar à Junta Nacional do Vinho, a qual foi criada no ano de 1936 15.
Esta última possuía um leque de atribuições mais amplo que a da antiga Federação, conseguindo, por isso, um maior espaço de manobra para lidar com os problemas que assolavam a indústria do vinho.
A sua acção era exercida em todo o território nacional, com excepção das ilhas adjacentes e das regiões vitícolas demarcadas. Esta tinha como fins: criar a consciência
corporativa, coordenar a acção dos organismos corporativos de produção e comércio de vinhos e seus derivados na sua área de influência, orientar a produção de vinhos, entre
outros. Uma das batalhas da Junta Nacional do Vinho foi a da “Política da Qualidade”, ou seja, a tentativa de preservação da genuinidade e origem dos vinhos, de maneira a não comprometer a exportação dos mesmos, recorrendo-se, para isso, a pessoal técnico competente.
Devido à variedade de tipos de vinho existentes em território nacional, foram demarcadas oito regiões vitivinícolas, “perfeitamente diferenciadas umas das outras, já pela especialidade do produto, já pela importância como ele entra na economia, já pelos processos de cultura usados”16: Vinhos Verdes, Douro, Dão, Carcavelos, Bucelas, Colares, Setúbal e Madeira. Contudo, havia ainda uma vastidão de regiões produtoras de vinho que não se encaixavam nas regiões anteriores, estando estas sob a alçada Junta Nacional do Vinho, à qual se deu o nome de Vinhos Comuns.
14 GRAÇA, Laura, “Agrícola”, Dicionário de História de Portugal, coord. António Barreto, MariaFilomena Mónica, vol. VII, suplemento A/E, Lisboa, Figueirinhas, 1999, p. 65.
15 Decreto-lei n.º 26 757, de 8 de Julho de 1936.
16 REIS, António Batalha, Organização da Viti-Vinicultura. Estudo da Organização Corporativa Portuguesa, Lisboa, s.l., 1938, p. 29.
Aproveitando-se desta divisão, a organização corporativa estabeleceu os seus organismos nas diferentes regiões demarcadas.
O Sindicato Agrícola da Região de Colares
A 2 de Fevereiro de 1930 foi fundada uma associação agrícola denominada Sindicato Agrícola da Região de Colares, a qual tinha sede na freguesia de Colares. Esta tinha como fins: promover o progresso da viticultura, vinicultura e pomicultura regional; desenvolver os conhecimentos da técnica agrícola moderna; facultar aos sócios a aquisição e utilização de máquinas agrícolas, adubos, sementes, plantas, etc; zelar pela pureza e genuinidade do vinho de Colares; organizar instituições de previdência e assistência rurais; promover a segurança da propriedade rural, criando uma polícia campestre para os prédios dos associados, entre outros. O Sindicato tinha como órgão superior a Comissão de Viticultura da Região de Colares, fundada a 25 de Maio de 1910, a qual tinha como fins: a fiscalização do transito do vinho, uvas, …; fazer o registo de propriedades existentes em Colares; elaborar estatísticas; passar certificados de procedência dos vinhos de Colares, entre outros.
Com a instauração do Estado Novo publicou-se um novo conjunto de diplomas legais, tendo o primeiro sido publicado 25 de Outubro de 1930, o qual alertava para a situação de perigo em que incorria o vinho de Colares, afirmando ser necessário assegurar a sua origem e genuinidade.
Salientou-se, ainda, neste texto a necessidade de criação de uma adega regional enquanto solução para a situação de crise, permitindo “a unificação de tipos e a maior perfeição no tratamento das massas vínicas e consequentemente a sua mais segura colocação nos mercados internos e externos”17. Esta mesma ideia foi exposta num artigo publicado no Jornal de Sintra: “Se houvesse necessidade de justificar a fundação da Adega Regional de Colares, bastaria relembrar um pouco o passado, e notaríamos que não existiam marcas que protegessem tanto o produtor como o comerciante contra os abusos e fraudes, garantindo a origem e a genuidade do produto, única maneira de sustentar o crédito dos nossos melhores vinhos de exportação.”18
17 Decreto-lei n.º 18 964, Diário do Governo, n.º 249, I série, 25 de Outubro de 1930, p. 2193.
18 E.S., “Associativismo agrário. Um importante relatório da ADEGA REGIONAL de Colares”, Jornal de Sintra, dir. António Medina Júnior, ano V, n.º 243, Sintra, Sintra Gráfica, 2 de Outubro de 1938, s.p..
Ficou, então, prevista a criação da Adega Regional de Colares, cujas funções, enquanto não era criada, pertenceriam à Comissão de Viticultura da Região de Colares,a qual viria posteriormente a desaparecer.
O diploma determinava, ainda, o uso obrigatório de marcas de garantia, fornecidas pela própria Adega. Para além do que ficou estabelecido que estaria proibida a plantação de vinhas em chão rijo nos terrenos na várzea, excepto se estes forem inadaptáveis a outra cultura.
A Adega Regional de Colares.A realidade cooperativa
A 15 de Agosto de 1931, com o apoio de vinhateiros que ligados ao Sindicato de Colares, foi, então, fundada a Adega Regional de Colares, associação cooperativa, cuja acção se desenvolvia na região demarcada de Colares.
Esta tinha como principais funções: a compra e utilização de máquinas e aparelhos necessários para o aperfeiçoamento da produção de vinhos; obtenção parcial ou totalmente as uvas produzidas na região conseguindo uma unificação e fixação do tipo de vinho regional; transformação em vinho das uvas frescas que lhe forem entregues; estabelecer uma harmonia entre produtores e comerciantes; efectuar as vendas a preços racional, …
Seriam seus fundadores os viticultores que assinassem os seus estatutos, e que houvessem tomado a iniciativa de constituir e organizar esta cooperativa, sendo já sócios do Sindicato, e todos aqueles que, tal como estes, se comprometessem a entregar as suas uvas à Adega, durante os três primeiros anos de existência.
Para além dos sócios fundadores existiam, ainda, os sócios ordinários, ou seja, aqueles que apesar de entregarem as suas uvas, parcial ou totalmente, não atingiriam os três anos; e os sócios aderentes, compostos por agricultores de Colares que, apesar de não entregarem as suas uvas, contribuíam com verbas para o fundo da Adega.
No ano de 1932, foi publicado novo decreto19 relativo à produção e comércio do vinho de Colares e à sua Adega Regional. Este determinou que, “na região de Colares, além do vinho típico, feito da casta Ramisco e produzido nas areias soltas da mesma região, que larga fama alcançou nos mais importantes mercados, outros há de
19 Decreto-lei n.º 21 455, de 7 de Julho de 1932.
qualidades muito apreciáveis e que por isso devem ser também, defendidos”20.
Estabeleceu-se que a região de Colares seria composta pelos terrenos da freguesia de Colares e pelos terrenos de areia solta da freguesia de S. Martinho e de S. João das Lampas, do concelho de Sintra. Contudo, o nome Colares só poderia ser distribuído pelos vinhos dos solos de areia solta, onde dominava a casta Ramisco, cujo estágio não deveria ser inferior a 240 dias. O seu engarrafamento era apenas permitido em armazéns situados dentro da região demarcada. Havia ainda as uvas das castas cultivadas em chão rijo na freguesia de Colares, para além das uvas brancas cultivadas em terrenos de areia solta produzidos por toda a região demarcada, os vinhos produzidos a partir destas adoptariam os subtítulos de “Chão Rijo” e “Vinho Branco”; não podendo nunca haver uma mistura das uvas de chão rijo com as de chão de areias soltas para o fabrico de vinho deste último lote; determinando este diploma a proibição de cultivo de vinhas em chão rijo.
Para certificar a origem e genuinidade deste vinho estabeleceu, este diploma, a criação de marcas de origem e marcas de garantia de vinho regional de Colares, as quais teriam de ser aplicadas nos recipientes em que o produto é vendido, sendo fornecidas pela Adega Regional. Estando as marcas de origem apenas destinadas ao vinho tinto da região das areias soltas de Colares, o qual era tido como o vinho por excelência da dita região; encontrando-se as marcas de garantia encontravam-se destinadas aos demais vinhos tinto e branco dos restantes terrenos da região.Quanto à comercialização deste vinho regional ficou estipulado que para tal era necessária a marca de origem ou de garantia, sendo somente permitido fazer o seu comércio aquele que estivesse inscrito nos registos da Alfândega de Lisboa e nos da Adega Regional de Colares, podendo apenas estar inscritos os produtores de vinhos regionais de Colares e os comerciantes que adquirissem estes vinhos.
No ano de 1934, o panorama legislativo dos vinhos de chão rijo alterou-se, deixando estes de usar as marcas de garantia, perdendo as regalias que essa marca lhes concedia, não lhes sendo permitido o uso do nome Colares, considerando-se terem sido produzidos fora da região demarcada.
20 Decreto-lei n.º 21 455, Diário do Governo, n.º 157, I série, 7 de Julho de 1932, p. 1404.
A corporativização da Adega Regional de Colares
No ano de 1934, foi publicado o decreto-lei n.º 24 500, aquele que viria a ser considerado como Diploma Estatutário da Adega Regional de Colares, enquanto organismo corporativo, ou seja, enquanto Grémio dos Viticultores local.
Este diploma conferiu novo significado à região demarcada, a qual era constituída pelos terrenos de areia solta das freguesias de Colares, S. Martinho e S. João das Lampas, do concelho de Sintra. Estando agora “excluídos os tufos de chão rijo que se encontrem naqueles terrenos e a várzea do rio das Maçãs.”21
Assiste-se, assim, a uma tentativa de apertado controlo e aperfeiçoamento do vinho típico da região de Colares, afastando todos os demais vinhos que poderiam vir a desvirtuá-lo; de acordo com o diploma “assim se fixam com mais rigor os limites da região e as castas produtoras”22.
De facto, a casta principal desta região é o Ramisco, havendo, porém, outras castas tintas: Parreira Matias, Parreira da Venha, Molar, Tinta Miúda e Santarém.
Todavia, no fabrico dos vinhos de Colares a casta Ramisco tinha de estar presente em percentagem não inferior a 60% nos primeiros cinco anos, sendo a percentagem elevada para os 80% nos três anos seguintes. Após oito anos só se poderá utilizar a casta Ramisco para o fabrico de vinho de Colares. Não podendo haver nunca uma mistura de uvas de areia solta com uvas de chão rijo. Obrigando-se, o vinho de Colares, a um estágio não inferior a dois anos. Ao mesmo tempo que o seu engarrafamento teria de ser feito em armazéns situados dentro dos limites da região de Colares.
Todos os vinhos que já estivessem armazenados à data deste diploma seriam considerados vinhos produzidos fora da região, estando apenas autorizados a usar o nome de Colares, a partir da colheita de 1934, os vinhos tintos produzidos na Adega Regional de Colares; também os vinhos brancos poderiam usar o nome de Colares enquanto tal fosse proveitoso do ponto de vista comercial, tendo de ser produzidos, também eles, na Adega Regional.
Como garantia da origem do vinho regional de Colares, também este diploma apostou na criação de uma marca de origem, apenas utilizada em recipientes usados para venda, armazenamento e transporte do vinho regional. Independentemente desta marca de origem seria criada uma outra de garantia utilizada para o vinho de Colares que fosse engarrafado sob a fiscalização da Adega Regional.
21 Art.º 1.º, Decreto-lei n.º 24 500, Diário do Governo, n.º 221, I série, 19 de Setembro de 1934, p. 1743.
22 Decreto-lei n.º 24 500, Diário do Governo, n.º 221, I série, 19 de Setembro de 1934, p. 1743.
Relativamente à comercialização deste vinho dispôs este diploma legal, assim como o haviam feito os diplomas que o antecederam, que seria “proibido expor, vender, armazenar, expedir, transportar ou exportar, com a designação de Colares ou qualquer outra localidade que pertença à região ou alguma com que ela se possa confundir, vinhos que não sejam os de pasto produzidos na região de Colares e que não obedeçam ao que é estabelecidos neste regulamento”23. Devendo os comerciantes e retalhistas do vinho de Colares estabelecidos nesta região estar devidamente inscritos, assim como os produtores, num registo especial da Adega Regional.
A exportação, por sua vez, só seria permitida aos comerciantes inscritos no Grémio do Comércio de Exportação de Vinhos.
A Adega Regional de Colares passou, assim, a estar devidamente enquadrada na organização corporativa a partir da publicação deste decreto, transformando-se no grémio dos viticultores da região de Colares, entendendo-se por viticultores: “todas as entidades singulares ou colectivas que na realidade de proprietários, usufrutários, arrendatários, sub-arrendatários, depositários, consignatários ou parceiros, ou em qualquer outra situação, cultivem ou venham a cultivar vinha nos terrenos de areia da região de Colares”24.
A natureza corporativista da Adega está presente nos artigos 33.º e 34.º deste diploma, determinando-se que esta é “uma organização corporativa”, que “exerce a sua acção exclusivamente no pano nacional e no respeito absoluto dos interesse da Nação, sendo-lhe proibida a filiação em quaisquer organizações de carácter internacional e a representado em congressos e manifestações internacionais sem prévia autorização do Governo, e deve subordinar-se os seus interesses aos da economia nacional, repudiando simultaneamente a luta de classes e o predomínio das plutocracias”.
Esta respondia perante o Ministério do Comércio e da Indústria, embora a sua vertente de acção social, da disciplina do trabalhado e na esfera da previdência, ficasse sob a alçada dos Sub-Secretariado de Estado das Corporações e da Previdência Social.
Enquanto grémio dos Viticultores a Adega Regional de Colares detinha as seguintes funções: orientar, fiscalizar, coordenar e defender a produção do vinho regional; solicitar do Governo os estudos necessários para a alteração da região
demarcada, tendo em atenção a qualidade dos mostos e a defesa da marca regional; criar
23 Art.º 15.º, Decreto-lei n.º 24 500, Diário do Governo, n.º 221, I série, 19 de Setembro de 1934, p. 1744.
24 Art.º 31.º §único, Decreto-lei n.º 24 500, Diário do Governo, …, p. 1745.
e manter o tipo definido do vinho de Colares; promover o estudo das castas de uvas mais convenientes para a região e dos métodos de fabrico e preparação dos vinhos, propondo as modificações julgadas necessárias; fornecer as marcas de origem e garantia e passar certificados de origem e boletins de análise para efeitos de exportação; fixar os preços de aquisição dos mostos ou vinhos e bem assim os preços mínimos de venda para o mercado interno; auxiliar os exportadores na defesa do prestígio da marca regional; proceder ao recenseamento dos trabalhadores rurais; proporcionar informações e auxílio aos seus associados na defesa dos seus elementos; inventariar em livro especial todas as propriedades que tenham vinha de areia, averbando todas as indicações que bem definam essas propriedades e a sua produção, compreendendo o cadastro dos valores industriais na Região e destinadas ao comércio dos vinhos de Colares; promover tudo o que tiver por conveniente aos interesses dos produtores, dos comerciantes e dos assalariados abrangidos pela zona da sua influência, e bem assim para o fomento vitivinícola da Região…
A direcção eleita a 4 de Outubro de 1934, constituída por Guilherme Guerra, Álvaro de Vasconcelos e Alberto Totta, elaborou, juntamente com Francisco Costa, um relatório e contas referente aos anos de 1934 a 1937 relativamente à acção da Adega Regional de Colares. Deste texto decidimos destacar algumas informações que julgamos serem pertinentes para o estudo em análise.De forma a cumprir o disposto relativo à promoção do estudo das castas de uvas mais convenientes para a região e dos métodos de fabrico e preparação dos vinhos, propondo as modificações julgadas necessárias, afirmavam os directores que, foram sendo entregues, ao Instituto Superior de Agronomia, à Estação Viti-Vinícola da Anadia e à Estação Agrária Central, bacelos e amostras de uvas necessárias para o estudo das uvas da região “a fim de se coligirem os elementos necessários a uma possível melhoria nos métodos e preparação dos vinhos de qualidade”25.
Quanto à sua relação com os seus associados no que se refere ao seu auxílio e informação, estes relatam a acção da Adega nesse sentido, afirmando ter, não só, informado os associados sobre os seus direitos e deveres, mas também exercido auxílio quer ao nível do socorro médico e farmacêutico, quer ao nível intelectual apresentando-os nas Festas Vindimarias, quer ao nível jurídico atribuindo-lhes advogados e ajudando materialmente para as associações de beneficência, recreio e instrução. Perante esta
25 COSTA, Francisco, GUERRA, Guilherme, TOTTA, Alberto, VASCONCELOS, Álvaro de, Relatório e
Contas (1934-1937), Colares, Adega Regional de Colares, 1938, p. 10.
situação podemos concluir que a Adega assumiu, ainda que parcialmente, a função da Casa do Povo, a qual foi somente fundada no ano de 197126; de facto a Adega auxiliou financeira, assistencial e culturalmente os agremiados da Adega Regional de Colares.
A Adega promoveu o vinho aí produzido recorrendo à publicidade, utilizando cartazes, menus, calendários, álbuns, recepções, representações, emblemas, medalhas, exposições, apresentações do rancho folclórico e fotografias, isto porque, “numa região, em crise, com um produto desconceituado e desacreditado por uma série de erros constantes e ininterruptos, urgente se tornava o recurso ao emprego duma enérgica e copiosa propaganda. Enobrecido o vinho de Colares pela acção da Adega Regional de Colares, indispensável foi organizar um plano de publicidade metódico, persistente e inteligente em que se revelasse ao público e ao consumidor as vantagens da organização e o que o produto tinha voltado às suas características e à sua pureza”27.
Quanto ao comércio externo, a direcção apontava um panorama relativamente obscuro para o Ramisco, na medida em que o nosso principal comprador – o Brasil, estaria a ser alvo de plantação e fabrico de vinho, o que gorava as nossas expectativas de venda para este país, para além de que os impostos pagos eram altíssimos. O mesmo se passava em África, onde o preço de uma garrafa de vinho inflacionava grandemente com os impostos cobrados. O vinho de Colares ainda tentou a sua sorte junto do mercado Norte-americano, o que se revelou benéfico, mas apenas a curto prazo, uma vez que a produção de vinhos na Califórnia despontou, em detrimento do vinho desta região.
Para além da crise do mercado externo, também o mercado interno apresentava um cenário pouco favorável ao escoamento do vinho em questão, culpa atribuída pela direcção à ganância dos retalhistas, situação apenas superável com a criação da Carta dos Vinhos Portugueses, onde seria fixado o preço de origem e o tabelamento das percentagens de revenda fixado na base ou categoria dos estabelecimentos de revenda.
26 Informação recolhida na obra Lista das Casas do Povo, Lisboa, Junta Central das Casas do Povo, 1974, p. 44.
27 COSTA, Francisco, GUERRA, Guilherme, TOTTA, Alberto, VASCONCELOS, Álvaro de, Relatório e
Contas (1934-1937),..., p. 14.
A transição para a Junta Nacional do Vinho
Com o início da II Guerra Mundial, a situação produtiva e comercial agravou-se por todo o País, ficando o ano de 1941 marcado na história da Adega Regional de Colares, pois foi neste ano que esta passou para a esfera de acção da Junta Nacional do Vinho.
De acordo com o relatório e contas da Junta Nacional do Vinho, o ano de 1941 “com o agravamento do conflito mundial, trouxe novas dificuldades apesar de todos os esforços, piorou nitidamente, aumentando as despesas, ao mesmo tempo que se agravavam as despesas gerais do produtor e do comerciante.”28 Contudo, das diversas dificuldades que foram surgindo “o mercado vinícola apresentou sempre feição animada e preços relativamente compensadores para a produção”29, muito devido ao comércio estabelecido com a Suiça e com o mercado americano.
Movimento Geral da Exportação do Vinho e derivados em 1941, em Litros
Estrangeiro
Destinos Total Geral
Bélgica e Colónias 2 971 104
Brasil 4 103 459
Estados Unidos da América do Norte 2 945 372
Rança (só Colónias) 1 967 456
Inglaterra e Colónias 1 268 330
Irlanda 818 975
México 640 784
Suiça 18 239 869
Outros destinos 618 674
Império Colonial Português
Cabo Verde 728 638
Guiné 529 574
S. Tomé e Príncipe 498 825
Angola 7 871 731
Moçambique 9 568 491
28 Junta Nacional do Vinho, Relatório e Contas do exercício de 1941, Lisboa, Editorial Império, 1941, p.5.
29 Id., Ibid., p. 5.
Índia 247 437
Macau 156 378
Timor 11 828
Total Geral 19 162 902
Ilhas Adjacentes
Madeira 89 023
Açores 530 307
Total Geral 619 330
Mantimentos para navios
Navios estrangeiros 117 667
Navios nacionais 1 0121 275
Total Geral 1 138 942
Fonte: Junta Nacional do Vinho, Relatório e Contas do exercício de 1941, Lisboa, Editorial Império, 1941, p. 17.
Uma das preocupações que assolou a produção vinícola foi a escassez de sulfato de cobre, essencial para as vinhas, tendo havido necessidade de recorrer à Comissão Reguladora dos Produtos Químicos e Farmacêuticos para normalizar o seu abastecimento fruto de uma verdadeira corrida a esse produto para a defesa das vinhas.
Nesta época a Adega Regional de Colares foi alvo de um inquérito, o qual revelava ser necessário “introduzir algumas modificações no sistema e na forma da sua efectivação.”30 Este Inquérito foi levantado por se acreditar que a Adega Regional não estaria a desempenhar as suas funções da melhor forma, o que implicava a existência de uma larga dívida, de tal maneira que, de acordo com o Subsecretário de Estado da Agricultura, a nova Direcção deveria “estudar a forma mais vantajosa de a Adega Regional liquidar os seus encargos aos estabelecimentos de crédito e à Junta Nacional
do Vinho”31. De acordo com o relatório elaborado pela nova Direcção o passado do vinho de Colares havia sido positivo para a sua produção e comércio, uma vez que este era um vinho de raízes longínquas na produção vinícola, cujas condições mesológicas e processos de cultura das castas, conferiam-lhe um sabor inigualável. Para além disso,
30 Id., Ibid., p. 101.
31 Id., Ibid., p. 101.
esta era uma vinha que, por ser plantada em chão de areia resistia à filoxera, praga que destruía as demais vinhas por todo o País.
Contudo, com o aprimoramento das técnicas viti-vinícolas durante o Estado Novo, vários foram os vinhos que foram fazendo as delicias dos paladares nacionais e internacionais, o que remetia o vinho de Colares para um plano secundário na tabela de exportações e até no consumo interno. De facto, estava-se perante uma “região de produção pequeníssima em relação á colheita geral”32.
Eis as razões apresentadas pela Direcção da Adega para a situação de crise em que esta se encontrava; contudo, não deixou de salientar a importância da existência da Adega, apontando para o facto de que, feitas as contas, desde 1934 a 1941 a soma das importâncias líquidas recebidas pela vinicultura foi bastante superior àquela que esta receberia se não houvesse o dito organismo.
Valor recebido: Valor sem Adega:
1934 1 245 857$08 788 443$00
1935 1 112 640$58 1 002 150$00
1936 360 784$10 404 804$00
1937 823 951$60 744 461$00
1938 1 018 586$70 879 314$00
1939 939 198$40 909 546$00
1940 568 256$25 581 009$00
6 069 274$71 5 309 727$00
Fonte: Junta Nacional do Vinho, Relatório e Contas do exercício de 1941, Lisboa, EditorialImpério, 1941, p. 103.
Após balanço realizado chegou esta Direcção à conclusão de que “A Adega Regional de Colares caminhou estoicamente e a passos largos, para um abismo donde a única saída seria a porta da falência de facto, porque a técnica já se havia verificado. No ano de 1938, agonizou e teria sucumbido se não tivesse recebido o milagroso amparo da Junta Nacional do Vinho no ano seguinte. Mas, como atrás dissemos, este amparo teve a acção de um balão de oxigénio que ao doente apenas alivia por momentos, voltando, por isso, no ano de 1940, a prosseguir na sua queda”33.
32 Id., Ibid., p. 103.
33 Id., Ibid., pp. 107-109.
A conclusão a que se chegou foi a de que a mecânica adoptada pela Adega conduziu-a a uma situação de falência, ainda que pagando insuficientemente à vinicultura, não conseguindo superá-la pelas suas próprias forças. A solução
encontrava-se num plano superior, com a passagem de Colares para a Junta Nacional do Vinho.
Foi, então, estabelecida uma linha geral do novo sistema que envolveria a nova etapa da existência da Adega, linha essa que teria em conta: a qualidade do vinho, a viticultura, o comércio, o plano económico-financeiro para o seu ressurgimento e a acção do Estado perante a Região.
Quanto à qualidade do vinho ficou estipulado que “dada a pulverização e a vulnerabilidade da região no que se refere ao trânsito, a única forma de garantir a origem do problema é a existência da Adega e de só o vinho nela fabricado ter direito à designação de Colares”34.
A aspereza característica deste vinho foi, igualmente, posta em causa, pretendia-se ainda que preservando as características do vinho de Colares, aproximar o seu paladar do gosto geral, suavizando-o.
Ao mesmo tempo seria necessário criar um vinho de segunda, o de chão rijo, porque “a pequena produção dos vinhos de Chão de Areia e a reconstrução necessariamente lenta das suas vinhas, vai dificilmente permitir a melhoria de situação económica regional e a amortização da Adega e o interesse comercial pela expansão dos produtos”35, para além disso, com o fabrico de segunda fornecia-se à classe média um vinho mais barato e em garrafão (vasilha mais utilizada por esta classe), por fim, “o facto de existirem produtores que colhem simultaneamente uvas de Chão de Areia e de Chão Rijo e que não têm onde vinificar estas, o que levou a Adega até 1939, a aceitar essas uvas, como não pode deixar de fazer-se, pois que a maior parte dos associados
abandonaram as suas instalações de fabrico”36.
Relativamente à viticultura aconselhava-se o aumento daquilo que recebia pela sua produção, “base da solução de todos os problemas que com ela se prendem”37.
34 Id., Ibid., p. 110.
35 Id., Ibid., p. 112.
36 Id., Ibid., p. 112.
37 Id., Ibid., p. 112.
Outra medida a ser tomada era a isenção da Adega do pagamento das contribuições e impostos, como forma de superar a crise em que vive, pedindo-se ao Estado que contribua, de alguma forma, para a resolução desta situação.
Deste relatório surgiu a aprovação do decreto-lei n.º 31 540, de 29 de Setembro de 1941, o qual determina que a “a região de Colares fica constituída pela área da freguesia de Colares e pelos terrenos de areia solta de S. Martinho e de S. João das
Lampas”38, para além de que a “referida região considera-se compreendida na área da Junta Nacional do Vinho, para efeitos da acção disciplinadora e coordenadora deste organismo”39.
Seriam apenas reconhecidos como vinhos de Colares, aqueles produzidos na Adega, distinguindo-se duas categorias: vinho de chão de areia – brancos e tintos provenientes de chão de areia, sendo obrigatório no fabrico dos tintos a entrada da casta Ramisco em percentagem não inferior a 80%; e vinho de chão rijo – lotes provenientes de chão de areia e de chão rijo. A venda do primeiro tipo seria feita em garrafas e a do
segundo em garrafões. Obrigando-se a um estágio de dezoito meses o vinho de chão de areia e a outro de seis meses para o vinho de chão rijo.
Manteve-se a marca de origem, assim como o selo de garantia. Sendo possível o uso de marcas particulares, tal como no diploma anterior.
Uma alteração surge no que respeita aos armazéns para engarrafamento do vinho de Colares, na medida em que podiam ser utilizados para o efeito os armazéns da Junta Nacional do Vinho. Apenas podendo ser engarrafado como vinho de Colares, o vinho proveniente da Adega Regional.
Quanto ao seu comércio estabeleceu-se, como nos diplomas anteriores, que seria proibido vender, armazenar, etc, com a marca de origem Colares ou de alguma localidade confundível com este região que não provenha da Adega Regional de Colares. Cabendo a sua exportação aos sócios do Grémio de Exportação de Vinhos.
Quanto à Adega propriamente dita, o diploma estabelece que esta tem por fins: a vinificação, em comum, das uvas dos seus associados; a venda dos respectivos produtos; a realização de crédito a favor dos seus associados; o fornecimento e aposição dos selos de garantia e a passagem de certificados de origem para a exportação e prestar informações e auxílio aos seus associados na defesa dos seus legítimos interesses.
38 Art.º 1.º, Decreto-lei n.º 31 540, Diário do Governo, n.º 227, I série, 29 de Setembro de 1941, p. 863.
39 Art.º 2.º, Decreto-lei n.º 31 540, …, p. 863.
Porém, cabia à Junta a orientar, fiscalizar e dirigir a acção técnica, económica,administrativa e financeira da Adega  Regional.
Conclusão
De acordo com a análise aqui apresentada podemos definir em traços gerais o percurso que a produção do vinho e os organismos que a enquadraram foram delineando durante a época do Estado Novo, em especial no que respeita à fase de arranque da Adega Regional de Colares.
O vinho era, sem dúvida, um dos produtos de origem agrícola mais importantes no que respeitava ao comércio interno e externo. Sendo, igualmente, um dos que mais mão-de-obra absorvia. Por todas estas razões intentou-se um melhoramento da sua qualidade, um equilíbrio dos seus preços e uma organização da sua produção através de melhorias ao nível técnico.
Para tal, foram adoptadas medidas que passavam, não só, por um aprofundamento dos conhecimentos técnicos ligados ao cultivo e produção do vinho, promovendo-se contactos com peritos estrangeiros, para uma troca de conhecimentos e de experiências, mas também, pela criação de adegas regionais que permitiam uma maior unificação dos tipos e uma maior perfeição na produção do vinho, conduzindo,assim, a uma colocação mais segura nos mercados interno e externo.
Durante este percurso foi implantado o corporativismo, o qual consolidou as formas de combate contra a crise que a cultura do vinho ultrapassava. Em Colares, a forma encontrada pela organização corporativa foi a jovem Adega Regional de Colares, à qual foram atribuídas características de organização corporativa, uma vez que esta se transformava no Grémio dos Viticultores da região, mantendo, porém, o seu nome original.
Também nesta Adega Regional houve a mesma preocupação que se sentia ao nível nacional no que respeitava à viti-vinicultura, desenvolvendo-se formas de aprimoramento do vinho regional, estabelecido desde o início com a separação das uvas de chão de areia e de chão rijo. Sendo considerado o vinho tinto de chão de areia solta,como o verdadeiro vinho de Colares. Houve, então, um conjunto de medidas assumidas para levar a cabo esse plano de garantia da genuinidade do vinho regional, com o estabelecimento de marcas de origem, da separação das uvas (inclusive as de tinto e branco de chão de areia), a percentagem obrigatória de utilização de uvas da casta Ramisco na produção de vinho de Colares, assim como a passagem de certificados para o comércio do vinho, assim, como o registo dos produtores e comerciantes da zona em questão.
Por outro lado, houve uma constante diminuição do cultivo de vinhas em chão rijo, determinado legalmente, obrigando-se estes vinhos, assim como os brancos de chão de areia a usar sub-títulos de “Chão Rijo” ou “Vinho Branco”, não podendo ostentar o nome de Colares. Situação que veio a agravar-se aquando da retirada das poucas regalias que os vinhos de chão rijo possuíam. A própria definição da região de Colares mostrava este contínuo afastamento da cultura de chão rijo.
Contudo, este cenário altera-se em 1941, após o relatório da nova direcção, a qual decide apostar no fabrico dos dois tipos de vinho, os quais possuem uma categoria distinta. Mas não é só ao nível da produção do vinho de chão rijo que o diploma legal datado de 1941 promove alterações. A própria Adega Regional, após ser alvo de um inquérito, devido à sua situação de falência passa a estar na esfera de acção da Junta
Nacional do Vinho, muito motivado também pelo crescente controlo do Estado durantea II Guerra Mundial.
Podemos concluir que a acção da Adega Regional de Colares durante a sua fase de arranque, apesar de não ter sabido gerir a situação de forma a conseguir caminhar este trilho pelos seus próprios meios, foi, sem dúvida, uma mais valia para os produtores de vinho da região, para os comerciantes e para o próprio vinho em si. Não esquecendo que a sua acção estava inserida numa máquina mais forte e bem oleada a que se deu o nome de Corporativismo.
Apesar de todos os esforços para melhorar a situação dos produtores e do próprio vinho, tudo fazendo para aprimorar a sua qualidade, a situação do vinho de Colares nesta época era melindrosa, na medida em que a produção não era equiparável a outros vinhos produzidos em solo nacional, figurando este vinho regional nos últimos lugares da tabela de exportação viti-vinícola. No entanto, não podemos deixar de referir que esta foi talvez a única forma encontrada para um equilíbrio dos preços praticados relativamente a este vinho, compensando da melhor forma os vários proprietários de vinhas da região, que tanto despenderam no cultivo das mesmas.
Bibliografia
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Periódicos
Jornal de Sintra
Diário da Manhã
Sintra. Boletim Municipal de Turismo de Sintra
Fontes
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