Visando debater de forma aberta e plural a temática da defesa
da floresta e da protecção do coberto vegetal em Sintra, nas suas várias
vertentes e prismas, promoveu a Alagamares no dia 28 de Abril passado um debate na
Sociedade União Sintrense, para o qual convidou técnicos, entidades e
ambientalistas, com vista a salientar as boas e más práticas e ajudar a apontar
soluções, numa óptica de participação positiva que a todos, como “jardineiros”
deste território hoje património da humanidade, está cometido.
Iniciou o debate o arquitecto Gonçalo Ribeiro Telles, o “pai”
da Reserva Agrícola e da Reserva Ecológica e um dos principais rostos da
política de ambiente das últimas décadas em Portugal. Enfatizando o papel da árvore no jogo
entre o colectivo e o convívio, Ribeiro Telles lembrou ser a eco indispensável
ao desenvolvimento, ironizando ter sido por a ter descurado “sido o homem
expulso do paraíso”. Vivemos na era do Caos, prosseguiu, o que dificultou a
potencialidade da fixação. Segundo ele, são os países que garantem a
biodiversidade os que mais têm potencialidade de segurança, tendo sido a
compartimentação dos espaços agrícolas o que permitiu o desenvolvimento da
civilização actual.
Garantir um contínuo verde através das cidades deverá ser um
mandamento do planeamento, enfatizou, na luta contra o Caos e distribuição
especulativa do território.”Continuamos no tempo da mancha e não do desenho do
paraíso”, rematou, referindo-se à visão fragmentada que os instrumentos de gestão
territorial fazem de realidades amplas e interligadas.
Eugénio Sequeira, da Liga da Protecção da Natureza, detendo-se
no tema da árvore em espaço urbano, refutou o entendimento de que se possam
fazer podas em árvores decorativas como as feitas em árvores de fruto, vincando
a necessidade de manter as árvores na medida do possível. “Para quê cortar a
totalidade quando só 20% estão doentes?” questionou. Tem de se fazer mais para
salvar as árvores, e nesse processo a auscultação das pessoas é fundamental,
bem como trazer as populações para a gestão das zonas verdes.
Nuno Oliveira, em representação da Parques de Sintra-Monte da
Lua, que gere 550 hectares de território dentro da Área de Paisagem Cultural
classificada como Património Mundial, caracterizou a serra de Sintra como zona
de eucaliptos, pinheiro bravo e espécies invasoras, e salientou o facto de não
terem havido intervenções na mata recentemente, embora a PSML esteja atenta à
invasão das lenhosas para as quais preconiza abates especiais, sendo essa
uma tarefa a longo prazo, bem como a arborização de áreas intervencionadas (60
hectares mais, até ao fim de 2012). Referiu também terem sido georeferenciadas
18.000 árvores na zona da PSML e mais de 35.000 árvores dentro do Parque da
Pena, estando em curso a classificação e medição desse vasto património
arbóreo. Quanto às podas, distinguiu as efectuadas na área da PSML, tendo sobretudo
em vista a segurança dos visitantes, que critérios de alinhamento ou segurança, típica das intervenções em zona urbana. Os abates ocorridos têm sido
precedidos de relatórios fitossanitários com base numa avaliação técnica
consciente.
O director do Departamento de Ambiente da Câmara de Sintra,
Carlos Albuquerque enfatizou ter nos últimos anos aumentado a participação dos
cidadãos em torno destes temas, bem como ter vindo a reduzir o número de
reclamações junto da autarquia. Anunciou a edição de uma brochura “´´Árvore
Morta, Árvore Posta”, na qual de forma pedagógica se pretende explicar o que
vai acontecer após o abate de árvores. Concordou com a necessidade de um
contínuo natural, propugnando que a próxima revisão do PDM consagre esse contínuo
na vertente norte-sul, sob pena de o Parque de Sintra-Cascais ficar cortado ao meio.
Reiterou uma melhoria nos procedimentos municipais, ao publicitar e divulgar os
relatórios previamente às intervenções, numa melhoria na relação com os
munícipes em comparação com procedimentos anteriores.
O representante do ICOMOS regozijou-se pela realização desta
iniciativa e referiu que “espécie invasora, a bem dizer, é o Homem” e informou
que esse organismo vai fazer a monitorização das áreas classificadas como
Património Mundial.
O representante da Sociedade Portuguesa de Alergologia, Rui
Brandão, da Universidade de Évora, procurou desfazer alguns mitos em torno das
árvores como fonte de alergias. Segundo ele, não há relação directa entre a
exposição a agentes polínicos e as alergias respiratórias, sendo as espécies
mais problemáticas a oliveira e a criptoméria japónica. Igualmente não serão os
polens os responsáveis pelas atopias respiratórias ou manifestações alérgicas,
nem as irritações podem ser tidas como alergias. São as coníferas quem mais
produz o pólen, mas o pólen é pobre em proteínas e para haver reacções
alérgicas terá de se verificar a existência dessa proteínas, explicou.
Aberto o debate, usaram da palavra diversos participantes.
André Beja, salientou a degradação da floresta e a falta de vigilância, bem
como o facto de as podas não serem correctamente executadas. Deplorou não haver
presentemente jardineiros em número suficiente ou viveiros da autarquia, que atribuiu à política de outsourcing praticada, constatando que dos abates de árvores
recentemente ocorridos em Sintra, só alguns considera justificados, sendo que
menos de metade das árvores foram repostas. Pedro Macieira criticou os cortes
selvagens com recurso à técnica de rolagem e João Pereira chamou a atenção para
outras zonas do concelho, como o Cacém, onde a arborização é secundária.
Depois de Bruno Quinhones questionar o tipo de espécies e
sementes usadas nas novas sementeiras, Adriana Jones, da ADPS, fez uma intervenção
condenando a extinção do Conselho Municipal de Ambiente e a paralisia do
Conselho Consultivo do Parque Natural Sintra-Cascais, bem como a falta do Plano
Verde, já elaborado em 2005. Outros intervenientes abordaram casos pontuais de
abates e podas na Correnteza e em Monte Santos (Luísa Morais) o destino das
madeiras ou seu abandono nas bermas (Esmeralda Luís) os cortes no Largo do
Morais (Jorge Menezes) ou a prática de desportos radicais na serra(José Manuel
Laranjo). Uma participante questionou mesmo se a nova brochura anunciada pelo
director de Ambiente da CMS foi precedida de consulta ou auscultação
pública.
Os participantes responderam às questões, dirigidas sobretudo
aos representantes da PSML e da Câmara Municipal, tendo sido informado ir a
Parques de Sintra plantar 50.000 novas árvores, e serem as sementes usadas
inteiramente certificadas, até por imposição de directivas europeias, no âmbito
dos concursos de aquisição. Tanto o representante da PSML como o da CMS
apelaram a mais acções de voluntariado, sobretudo no arranque das
acácias, reiterando Carlos Albuquerque ser de incrementar uma cultura de
contacto com os munícipes.
Postas mais de 3 horas de profícuo debate e troca de
informações, entende a Alagamares ter sido dado um contributo para essa cultura de
contacto, em que se troquem informações, ouçam os parceiros da sociedade civil,
desmistifiquem falsas verdades e se chamem as populações a contribuir na
preservação do território do qual é toda ela beneficiária. A Alagamares voltará ao
tema, neste ou noutro figurino, numa óptica de participação positiva e disponibilidade
para construir pontes e tornar o diálogo permanente.
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